Na noite de 17 de setembro de 1865, em Salvador, um grupo de
intelectuais composto por escritores, professores, militares e magistrados se
reuniu para tentar atrair alguma alma desencarnada. De repente, um deles
começou a rabiscar, os demais observavam as palavras sendo despejadas na folha
de papel. Posteriormente contaram que todos se comoveram antes mesmo de
conhecer o conteúdo da mensagem, que foi assinada por um espírito chamado Anjo de Deus que estava entre eles.
“Na maior parte do mundo, o espiritismo é visto como uma moda do
século 19. No Brasil a história é bem diferente: nossos 3,8 milhões de
seguidores da doutrina de Allan Kardec fazem do Brasil a maior nação espírita
do planeta” – André Schröder, site oficial da
Revista Superinteressante – visitado em 28/05/2018.
Esse episódio é considerado o início oficial do espiritismo no Brasil, e
também marcou a inauguração do primeiro centro espírita em nosso país.
Entretanto, a ideia da possibilidade de falar com os mortos não era estranha
por aqui, porque as crenças africanas e indígenas já conviviam com o
catolicismo oficial dominante, e essa é a primeira razão, dentre outras, que
explicam a acolhida e o rápido desenvolvimento do espiritismo por todo o país.
Num estudo acadêmico da USP, publicado na internet, a socióloga informa que o
espiritismo veio para o Brasil pelas mãos de dois médicos homeopatas:
“O espiritismo logo chegou ao Brasil, trazido pelos médicos homeopatas e
também médiuns Bento Mure e João Vicente Martins, em 1840, sendo aceito por um
grupo de médicos também homeopatas do Rio de Janeiro que formaram o Grupo
Confúcio. O grupo recebeu uma mensagem espiritual informando que o Brasil fora
escolhido como o país para o qual iria se transplantar a ‘árvore do Evangelho’,
onde o espiritismo iria se desenvolver. Ismael, mensageiro de Jesus, foi
encarregado de cuidar do espiritismo no país. O espiritismo se difundiu, vários
grupos se formaram, e em 1884 foi fundada a Federação Espírita Brasileira com o
fito de reuni-los” (Alice
Beatriz da Silva Gordo Lang, Doutora em Sociologia pela Universidade de São
Paulo. Pesquisadora do Centro de Estudos Rurais e Urbanos) –
http://www.revistas.usp.br/ceru/article/view/11863/13640.
Por esse tempo, meados do século XIX, os escritos de Kardec (que anos
depois foram organizados nos cinco livros da “codificação espírita”) não
estavam traduzidos do francês para o Português, por isso os primeiros adeptos
dessa nova religião eram membros das classes mais abastadas cultural, social e
economicamente na época.
Esses intelectuais brasileiros, cidadãos de prestígio na corte de D.
Pedro II, adeptos das novas teorias político-filosóficas que fervilhavam na
Europa, se reuniam na redação do jornal francês Courrier du Brésil, juntamente com alguns franceses
opositores do regime de Napoleão III (sobrinho de Napoleão Bonaparte, que fora
eleito Presidente da República na França) que vieram para o Brasil. O que
prendeu a atenção e entusiasmou aquelas pessoas, mais do que as revelações dos
espíritos, é que a nova filosofia-religião proposta os deixava livres das
doutrinas cristãs ortodoxas e combinava com suas ideias modernas. Além disso, o
espiritismo tinha um componente místico que interessava muito aos intelectuais,
que então poderiam cultivá-lo, pois aderindo ao espiritismo saíam fora do
controle moral exercido pela Igreja Católica, mas ainda assim podendo declarar
em alto e bom som que eram cristãos. Os espíritas fazem isso até hoje! Assim,
apoiado e incentivado por essa parcela influente e respeitadas da sociedade
brasileira, encrustrada nos centros de poder da nação, o espiritismo ganhou
legitimidade, foi alargando seu campo de influência, chegou à classe média
carioca e foi se expandindo para outras cidades brasileiras.
Nesse ponto, um outro componente importante impulsionou o espiritismo de
forma irreversível: a ação médico-social. Inicialmente os espíritas se voltaram
para os doentes que não tinham condições financeiras para tratar-se e não
recebiam atendimento nos serviços públicos de saúde. Era grande o número de
médicos, principalmente homeopatas, convertidos ao espiritismo, e eles passaram
a misturar medicina com curandeirismo. A consulta médica também era uma
consulta espiritual, o receituário era místico, e isso, evidentemente, não foi
aceito passivamente pelos médicos tradicionais, que iniciaram uma batalha
contra essa prática.
O Império terminou, o Brasil se tornou um Estado laico e a nova
Constituição de 1891 garantia a liberdade de culto, mas o Código Penal
criminalizou a prática do espiritismo, da magia, da cartomancia, da homeopatia,
da cura magnética e de qualquer tipo de curandeirismo. Na prática ser médium
era crime, porque o espiritismo estava voltado para a cura de todos os tipos de
males. Nesse tempo vários espíritas foram presos.
Surgiu então nesse cenário o Dr. Adolpho Bezerra de Menezes, médico rico
e muito respeitado, que após uma tragédia pessoal se convertera ao espiritismo,
e passou a dedicar-se inteiramente aos pobres, dando-lhes assistência médica e
social (quando morreu era tão pobre quanto eles). Bezerra convenceu o
presidente da República, Deodoro da Fonseca, que eram descabidas as
perseguições aos espíritas, pois eles não eram charlatães, já que nada ganhavam
pelo atendimento médico e espiritual que prestavam, destacando que seus “clientes”
eram pessoas que não tinham acesso a médicos e hospitais. O Código Penal não
foi alterado, mas os médiuns espíritas deixaram de ser perseguidos e voltaram a
“trabalhar”, sob intenso protesto da classe médica.
Alguns anos depois, em 1931, dois médicos psiquiatras, professores da
Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, Dr. Leonídio Ribeiro e Dr. Murillo de
Campos, publicaram o livro “O Espiritismo no Brasil – Contribuição ao seu Estudo Clínico e
Médico-Legal”. Em 1958
foi publicado no Brasil o livro As Fraudes Espíritas e os Fenômenos Metapsíquicos, que vinha sendo publicado em diversos
idiomas desde 1930, de autoria do Padre Jesuíta Carlos M. de Heredia. Esses
dois livros, segundo seus autores, são produto de muitos anos de pesquisa.
Trazem relatos e testemunhos de experiências espíritas muito negativas,
analisadas do ponto de vista médico-científico. Ainda assim, o espiritismo
prosseguiu, e os espíritas declarados são aproximadamente 4 milhões, mas os
“simpatizantes” do espiritismo (todas as correntes) é estimado em mais de 60
milhões. Muitos “católicos” vão à missa no domingo e nos centros espíritas
durante a semana. De seu lado, os espíritas se casam e batizam seus filhos na
igreja católica. Por isso hoje o Brasil carrega o vergonhoso título de maior
nação espírita do mundo.
Em pleno século XXI, arautos do espiritismo continuam ocupando cargos
importantes no contexto político-social brasileiro. Fazem questão de marcar
presença e querem que todos saibam que são acompanhados e dirigidos pelos espíritos que chamam de guias, mentores ou
protetores.
Por exemplo, o número de médicos e juízes espíritas é assustador para os
cristãos. Existe a Associação Médico Espírita do Brasil, de âmbito nacional e
suas filiadas nos estados. A “missão” dessa associação pode ser conhecida na
sua página oficial na internet, da qual extraímos o print abaixo:
http://www.amebrasil.org.br/html/ame_missao.htm
Também muito ativa é a Associação Brasileira dos Magistrados Espíritas.
Uma amostra:
O depoimento de um dos juízes espíritas associados nos dá uma ideia de
sua atuação:
“Para o juiz José Carlos de Lucca, representante paulista da Associação
Brasileira dos Magistrados Espíritas, a escolha de sua profissão não foi uma
casualidade e, por isso, a exerce como uma missão de vida. “Sou juiz para
quitar alguma dívida do passado”. Sobre a disputa presidencial no Tribunal
de Justiça, ele diz que espera um incentivo do novo presidente para ver
difundida a luz do espiritismo no meio jurídico. “Quanto maior o incentivo,
melhor. Mas não apoiamos nenhum candidato específico. Nossa associação tem
finalidade religiosa, não política”, afirma” (grifo nosso).
http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u27207.shtml
Na Câmara dos Deputados, que é a Casa do Povo, tornou-se
corriqueiro um parlamentar espírita, que esteja ocupando assento na Mesa
Diretora (presidente, dois vice-presidentes e quatro secretários)
intempestivamente “receber seu guia” durante uma sessão plenária,
como se estivesse numa sessão espírita. Nem sempre essas ocorrências são noticiadas,
mas várias delas podem ser encontradas na internet. Ilustramos com alguns
prints:
São comuns também, na Casa do Povo,
homenagens a representantes do espiritismo, e até uma exposição comemorativa da
atuação espírita na Câmara dos Deputados foi realizada, como se vê nos prints
abaixo:
Na manhã do dia 6 de novembro, a Câmara dos Deputados promoveu dois
momentos históricos para o Movimento Espírita: inauguração da Exposição “150
anos da presença espírita no Parlamento Brasileiro (1864-2014) – Homenagem
póstuma”, sobre parlamentares espíritas que tiveram destaque na atuação na
Câmara Federal e Sessão Solene em homenagem ao palestrante Divaldo Franco.
Com grande público, a inauguração contou com a presença do autor do
projeto Flávio Rey de Carvalho, fala do presidente da FEB, Antonio Cesar Perri
de Carvalho e dos deputados Colbert Martins e Maurício Trindade, além da
presença do médium e orador Divaldo Franco, que seria homenageado em sequência,
na Sessão Solene que lotou o Plenário da Casa.
Esse histórico resumido do início e expansão do espiritismo kardecista
no Brasil, e sua influência na medicina, na justiça e na política, nos ajuda a
entender o panorama geral do desenvolvimento dessa seita maligna, absolutamente
anti-bíblica (Dt. 18.9-14; Is. 8.19). Do ponto de vista da apologética cristã,
nos interessa olhar mais de perto a atração que o espiritismo exerce, com o
objetivo de desenvolver estratégias de evangelismo eficazes, considerando o
conselho do apóstolo Paulo:
“E ao servo do Senhor não convém contender, mas sim, ser manso para com
todos, apto para ensinar, sofredor; instruindo com mansidão os que resistem, a
ver se porventura Deus lhes dará arrependimento para conhecerem a verdade, e
tornarem a despertar, desprendendo-se dos laços do diabo, em que estão presos” (IITm. 2.24-26).
O apologista Lídio Hamon identificou nove apelos do espiritismo,
dirigidos a pessoas com diferentes interesses, necessidades e motivações, que
têm alcançado sucesso na ampliação da seara espírita (Revista Defesa da Fé, nº
71, ICP, 2004):
O Apelo Científico
O Apelo Cristológico
O Apelo Escriturístico
O Apelo Cosmológico
O Apelo Racional
O Apelo Emocional
O Apelo Romântico
O Apelo Filantrópico
O Apelo de Cura
APELO CIENTÍFICO
No livro O Evangelho Segundo o Espiritismo, Kardec escreveu: “O espiritismo é a junção perfeita da
ciência com a religião”.
Devemos lembrar que sua época abraçou o apogeu das descobertas científicas.
Qualquer ensino que não passasse pelo crivo de qualidade dos padrões
científicos seria ridicularizado. Aliás, a religião, de uma forma geral, estava
sendo ridicularizada por não atender esses padrões. Segundo o conceito geral de
Chapman Cohen (famoso filósofo inglês ateu) “deuses são coisas frágeis; eles
podem ser mortos com uma baforada de ciência ou uma dose de senso comum”.
Por isso, inicialmente, o espiritismo sempre insistiu em afirmar seu
caráter científico: “O
espiritismo é, antes de tudo, uma ciência e não cuida de questões dogmáticas…
Melhor observado depois que se generalizou, o espiritismo vem derramar luz
sobre um grande número de questões, até hoje insolúveis ou mal compreendidas.Seu
verdadeiro caráter é, portanto, de uma ciência e não de uma religião” (O Que É O Espiritismo, Terceiro
Diálogo, Objeções em Nome da Religião – grifo nosso).
Entretanto, pode-se conferir ao espiritismo a mesma segurança dos
conhecimentos científicos? Sua alegação foi aceita por todos? Na Inglaterra,
foi criada a Sociedade de Pesquisas Psíquicas, que visava aplicar ao
espiritismo os mesmos critérios usados para a investigação científica. Em sua
História do Espiritismo, Artur Conan Doyle, o célebre criador de Sherlock
Holmes, faz diversas referências ao fracasso das pesquisas espíritas para
enquadrá-lo dentro dos padrões da ciência:
“Onde a sociedade foi menos feliz foi no que se refere aos chamados
fenômenos físicos do espiritismo”. Mr. E. T. Benett, que durante vinte anos foi secretário assistente da
Sociedade, assim se exprime a respeito: “É um fato notável, e nós nos inclinamos a dizer que é uma das
coisas mais notáveis na história da Sociedade, que esse ramo de
investigações tivesse sido — e não há nisso exagero — absolutamente falho de
resultados. Também deve ser dito que o resultado foi mais falho
quanto maior a simplicidade do fenômeno […] Em toda a série de volumes publicados
pela Sociedade, nenhuma luz foi derramada sobre os simples fenômenos de ver e
ouvir. Em relação aos fenômenos físicos mais elevados, que implicam
inteligência para a sua produção, tais como a escrita direta ou a fotografia de
espíritos, algumas investigações foram feitas, mas em grande parte com
resultados quase que inteiramente negativos”.
A falta de comprovação científica, que mantém o espiritismo no campo da
crendice, persegue a seita desde seu nascedouro e se mantém de pé no século
XXI. Desde as primeiras publicações das “experiências espíritas” que realizava,
na Revista Espírita, periódico criado por Kardec
para esse fim, o núcleo científico da Universidade de Paris apresentou sérios
questionamentos que ele não conseguia responder. A consistência e o volume das
objeções científicas apresentadas o obrigaram a tratar do assunto nas primeiras
páginas do Livro
dos Espíritos e
em todos os demais livros da codificação espírita.
Na Introdução do Livro dos Espíritos Kardec inseriu o item ‘A Doutrina Espírita e a Ciência’, onde se vê com toda clareza que as
corporações científicas fizeram forte oposição às suas ideias. A comunidade
científica se pronunciou por ter sido provocada, pois Kardec afirmava ter
comprovado cientificamente a comunicação com os mortos e a reencarnação, coisa
que ninguém no mundo fez até hoje. A questão não era, e ainda hoje não é, se os
fenômenos e as comunicações acontecem ou não, mas sim quem são os agentes que
os promovem, e Kardec insistia que recebia informações de respeitados personagens
da História do Cristianismo: os apóstolos, os pais e os doutores da igreja,
padres e bispos franceses que impactaram os lugares onde viveram por seu
testemunho cristão, assinam as aleivosias de Kardec.
Dois exemplos curiosos das “informações científicas” noticiadas por
esses mentores atestam a afinidade do
espiritismo com a ciência: existe água na Lua (A Gênesis, cap. VI, itens 24 e
25) e há vida humana em diversos planetas (A Gênesis, cap. VI, Uranografia
Geral).
É bom não esquecer que a academia de ciências da Universidade de Paris,
à qual pertencia o professor Hippolyte Leon Denizard Rivail (Allan Kardec), na
época era o celeiro de todo saber da humanidade. Portanto, os opositores
da ‘comprovação
científica’ das
ideias kardecistas não eram pessoas comuns aculturadas. A transcrição de alguns
trechos da defesa que Kardec apresentou são
reveladores de que ciência e espiritismo não andam e nunca andaram de mãos
dadas:
“A oposição das corporações científicas é, para muita gente
senão uma prova, pelo menos uma forte presunção contrária… Entretanto, sua
opinião não poderia representar, em todas as circunstâncias, um
julgamento irrevogável…
Quando a ciência sai da observação material dos fatos e trata de
apreciá-los e explicá-los, abre-se para os cientistas o campo das
conjecturas: cada um constrói o seu sistemazinho, que deseja fazer
prevalecer e sustenta encarniçadamente…
No tocante às coisas evidentes, a opinião dos sábios é
justamente digna de fé, porque eles as conhecem mais e melhor que o vulgo.
Mas no tocante a princípios novos, as coisas desconhecidas, a sua
maneira de ver não é mais do que hipotética, porque eles não são mais
livres de preconceitos que os outros… “
Direi mesmo que o sábio terá, talvez, mais preconceitos que qualquer
outro, pois uma propensão natural o leva a tudo subordinar ao ponto de vista de
sua especialidade…”
Todo homem que se dedica a uma especialidade escraviza a ela suas ideias. Afastai-o do assunto e ele quase
sempre se confundirá, porque deseja tudo submeter ao seu modo de ver; esta é
uma consequência da fragilidade humana…”
“A ciência, propriamente dita como ciência, é incompetente para
pronunciar-se sobre a questão do espiritismo: não lhe cabe ocupar-se do
assunto e seu pronunciamento a respeito, qualquer que seja, favorável ou não,
nenhum peso teria”.
“O espiritismo é o resultado de uma convicção pessoal que os
sábios podem ter como indivíduos, independente de sua condição de sábios.
Querer, porém, deferir a questão à ciência seria o mesmo que entregar a uma
assembleia de físicos, ou astrônomos, a solução do problema da existência da
alma. Vê-se, portanto, que o espiritismo não é da alçada da ciência”.
(Livro dos Espíritos, capítulo VII da Introdução, A Ciência e o
Espiritismo – grifo nosso).
Com o passar do tempo, o espiritismo abandonou a defensiva científica e
assumiu a posição de religião, porém sem abdicar totalmente de seu caráter
científico. Esse aspecto kardecista nos faz lembrar da advertência do apóstolo
Paulo a Timóteo: “Ó
Timóteo, guarda o depósito que te foi confiado, tendo horror aos clamores vãos
e profanos e às oposições da falsamente chamada ciência, a qual,
professando-a alguns, se desviaram da fé. A graça seja contigo. Amém” (lTm. 6.20-21).
APELO CRISTOLÓGICO
O destaque conferido à pessoa de Jesus Cristo foi outro fator que
contribuiu para o avanço do espiritismo ensinado por Kardec. O Ocidente, de
modo geral, e o Brasil, de modo específico, se intitulam cristãos. Independente
do conhecimento que estes tenham do evangelho, a figura de Jesus é dominante na
cultura. Em seu livro O Evangelho Segundo o Espiritismo, Kardec tenta
sintetizar dois segmentos religiosos definitivamente antagônicos. Até então,
não existia o chamado “espiritismo cristão”. Mas, ao fazer de Jesus um médium
(para os espíritos Jesus era médium de Deus), o grande decodificador do
espiritismo fez que muitas pessoas se aproximassem de práticas até então
condenadas, e ao mesmo tempo se sentissem cristãs.
Todavia, o uso de certo termo não significa que o mesmo esteja se
referindo a coisas semelhantes. Temos de nos preocupar com a essência por trás
das palavras. Quando o kardecismo fala em Jesus, de qual Jesus está falando? O
mesmo Jesus dos evangelhos? O mesmo Jesus conhecido dos apóstolos? Paulo
escreveu aos coríntios: “Mas temo que, assim como a serpente enganou Eva com a sua astúcia,
assim também sejam de alguma sorte corrompidos os vossos sentidos, e se apartem
da simplicidade que há em Cristo. Porque, se alguém for pregar-vos outro Jesus
que nós não temos pregado, ou se recebeis outro espírito que não recebestes, ou
outro evangelho que não abraçastes, com razão o sofrereis” (IICo. 12.3-4). Precisamos
saber se o espiritismo possui o Jesus bíblico ou “outro Jesus”.
No evangelho de João, lemos sobre a natureza de Cristo: “No princípio era o Verbo, e o Verbo
estava com Deus, e o Verbo era Deus […] E o Verbo se fez carne, e habitou entre
nós, e vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai, cheio de
graça e de verdade” (Jo.
1.1,14). Jesus era o Deus Filho que assumiu a natureza humana. A Bíblia diz o
seguinte: “Nele
habita corporalmente toda a plenitude da divindade” (Cl. 2.9).
Sobre João 1.1, escreveu Kardec: “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus
[…] Primeiramente, é preciso notar que as palavras citadas são de João
e não de Jesus. Admitindo-se que não tenham sido alteradas, não exprimem, na
realidade, senão uma opinião pessoal, uma indução que deixa
transparecer o misticismo habitual, contrário às reiteradas afirmações do
próprio Jesus. Mas aceitando-as tais como estão, elas não resolvem
absolutamente a questão da divindade de Jesus, pois aplicam-se igualmente a
Jesus como criatura de Deus… Jesus podia ser encarregado de transmitir a
palavra de Deus sem ser Deus, como um embaixador transmite as palavras de seu
soberano” (Obras Póstumas, cap. VIII, O Verbo se Fez Carne –
grifo nosso).
Léon Denis, sucessor de Allan Kardec, o consolidador do kardecismo,
negou a obra redentora de Jesus na cruz. Embora a Bíblia diga que Ele é o
Cordeiro de Deus (Jo. 1.29), que tira o pecado do mundo, Léon negou isto
veementemente: “Não, a
missão de Cristo não era resgatar com o seu sangue os crimes da humanidade. O
sangue, mesmo de um Deus, não seria capaz de resgatar ninguém. Cada qual deve
resgatar-se a si mesmo”(Cristianismo
e Espiritismo, FEB, 7ª edição, 1978, p. 86).
Como sabemos, Jesus disse que veio para servir e dar a sua própria vida
em resgate de muitos (Mt. 20.28). Isso mostra que o Jesus do espiritismo não é
o mesmo do Cristianismo.
APELO ESCRITURÍSTICO
A Bíblia é o livro por excelência. Tornou-se um referencial tão sólido
no Ocidente, que quando um livro é o mais importante de determinado ramo de
conhecimento diz-se comparativamente que ele é a Bíblia de tal assunto. Há
quase uma aceitação automática da Bíblia como Palavra de Deus. É parte
integrante de nossa cultura, independente da religião professada ou praticada.
Por esse motivo, o espiritismo de Kardec fez amplo uso das Escrituras
Sagradas, tanto do Antigo quanto do Novo Testamento, para provar seus
ensinos. O
Evangelho Segundo o Espiritismo traz amplas citações das Escrituras. Diversas passagens são
analisadas à luz da doutrina espírita. Embora não ocorram, em nenhum lugar da
Bíblia, as palavras reencarnação e carma, Kardec faz a Bíblia dizer o que ela
não diz, distorcendo muitas passagens da Palavra de Deus para que se encaixem
em sua opinião.
Como é comum nas seitas, as passagens são citadas isoladamente, fora de
contexto, estritamente selecionadas e com alteração de tempos do verbos e
pontuação. Ou seja, a Bíblia não é usada como um todo, mas apenas as passagens
consideradas favoráveis aos pontos de vista espíritas, e ainda assim
devidamente ajustadas à eisegese[1] deles.
O problema é que as práticas espíritas são continuamente condenadas na
Bíblia. Passes, diálogos com mortos, movimentação de objetos, entre outras, têm
mais a ver com os fenômenos demoníacos apresentados nas páginas do Novo
Testamento. A reencarnação foi rejeitada em Hebreus 9.27 e a multiplicidade de
vidas em corpos diferentes está longe de ser uma ideia cristã.
Recentemente os espíritas lançaram dois livros que, segundo seus
autores, trazem a tradução e a hermenêutica correta (feita por eles) da Bíblia.
Inúmeros textos bíblicos, desde que corretamente traduzidos e interpretados,
segundo os espíritas, apresentam a reencarnação e a comunicação com os mortos
como crenças absolutas e práticas corriqueiras, positivas e incentivadas desde
o tempo de Moisés, e sua continuidade na igreja primitiva seria incontestável.
A premissa espírita é que médium é
sinônimo de profeta, portanto a Bíblia é um livro mediúnico recheado de
narrativas das comunicação entre os homens e os espíritos, insistem os
espíritas.
É fácil perceber que o kardecismo usa a Bíblia como isca. O primeiro
livro de Kardec, publicado em 1857, com o título Livro dos Espíritos, mostra a
verdadeira fonte do espiritismo — os seres desencarnados com os quais Kardec
entrou em contato. Para uma religião que se intitula o verdadeiro Cristianismo,
o kardecismo possui bases muito estranhas. Já Isaías proclamava, cerca de
setecentos anos antes de Cristo: “Quando, pois, vos disserem: Consultai os que têm espíritos familiares e
os adivinhos, que chilreiam e murmuram: Porventura não consultará o povo a seu
Deus? A favor dos vivos consultar-se-á aos mortos? A lei e ao testemunho! Se
eles não falarem segundo esta palavra, é porque não há luz neles” (Is. 8.19-20).
APELO COSMOLÓGICO
Cosmologia é a maneira como alguém compreende o mundo ao seu redor. É
como consegue encaixar o universo em um todo coerente. Durante a história do
homem sobre a Terra, cada povo teve sua cosmologia particular, que foi mudando
ao longo do tempo. A doutrina da reencaração levantava de imediato duas
perguntas de ordem prática:
Se as almas estavam reencarnando, por que a população aumentava? De onde
vinham as almas excedentes?
Se a reencarnação era um processo que aperfeiçoava os homens, por que a
humanidade e o sofrimento pareciam crescer ao invés de diminuir?
Para tentar explicar essas relevantes perguntas, Kardec formulou sua
própria cosmologia. Segundo sua explicação, esta Terra é apenas um entre muitos
planetas habitados. As almas excedentes teriam vindo de outros planetas,
justificando, assim, o aumento populacional da Terra. Do mesmo modo, o
sofrimento e a maldade não diminuem porque o nosso planeta é um lugar de
“purgação”, onde as almas viriam para expiar seu carma por meio do sofrimento.
E, tentando defender biblicamente sua posição, cita João 14.2, onde Jesus diz
que na “casa
de seu Pai há muitas moradas”.
Logo, a cosmologia de Kardec, apesar de satisfazer alguns, não é sólida.
Baseia-se na existência de vida em outros planetas, coisa para a qual não
existem quaisquer comprovações. Faz de uma interrogação uma afirmação, de uma
suposta probabilidade, um fato. Isso, no entanto, de modo algum serve de
alicerce concreto para uma crença. Antes, é uma saída de emergência.
Do mesmo modo, João 14.2 não diz nada sobre vida em outros planetas.
Identificar a casa do Pai com o Universo e as moradas com planetas está além de
qualquer regra de hermenêutica.
Este não é um planeta criado para purgações. Quando Deus o completou,
viu que era “muito
bom” (Gn. 1.31). Se hoje há dores e
sofrimento é devido ao resultado do pecado e não do planejamento de Deus (Gn.
3.17-19). Deus deu esta terra aos filhos dos homens para que habitassem nela
(SI. 115.16) e não outro planeta.
APELO RACIONAL
O kardecismo supostamente fornece uma explicação intelectual para certos
fatos da vida e tal explicação consegue, de alguma forma, tornar aceitáveis as
situações difíceis. Ao expressarmos essa teoria, de forma alguma, estamos
dizendo que essas explicações são verdadeiras, mas simplesmente que foram
largamente aceitas, devido à sua mera aparência de verdade.
Dizer que uma criança nasceu deficiente por motivos existentes numa vida
anterior, embora seja uma mentira impossível de provar, para alguns parece ser
uma explicação razoável. Dizer que fatos presentes são consequência de atos
injustos cometidos em outra vida, parece plausível para alguns (como o juiz
espírita que citamos no início), e também parece explicar as exorbitantes
diferenças das condições de vida das pessoas:
Por que alguns são muito felizes e outros, muito tristes?
Por que uns são muito ricos e outros, muito pobres?
Por que tanta discrepância se todos são seres humanos?
Para os espíritas essas respostas estão escondidas em uma existência
anterior a esta.
Mas, apesar de existir certo traço de racionalidade nessa colocação, ela
é perversa. Por exemplo, uma pessoa que sofre muito nesta vida, sente-se,
devido a essa teoria, automaticamente culpada por seus próprios sofrimentos,
torna-se culpada sem saber qual é a sua culpa, e deve aceitar passivamente que
tal culpa está relacionada a uma vida anterior, da qual não tem a menor
lembrança. Imaginem um prisioneiro na cadeia, sendo torturado, sem que ninguém
lhe diga qual é o seu crime, mas tendo que acreditar que, se está sendo punido,
deve haver alguma razão para isso. Há mais um agravante de peso considerável
nessa situação, que é a ideia de não gastar nenhum esforço para reverter o
quadro, nem tentar diminuir o sofrimento, porque caso isso ocorra será
necessário enfrentar a mesma dor numa nova reencarnação, até que a dívida seja
totalmente resgatada. Essa teoria parece ser a doutrina racional do desespero,
ou algo do tipo. Surpreendentemente, os espíritas lhe dão o nome “doutrina eminentemente consoladora”:
“Reconheçamos, em resumo, que a doutrina da pluralidade das
existências é a única que explica o que, sem ela, é inexplicável.
Que é eminentemente consoladora e está em harmonia com a mais rigorosa
justiça e é, para o homem, a âncora da salvação que Deus lhe
deu na sua misericórdia” (Livro dos Espíritos, Parte II, Cap. 5,
Considerações Sobre a Pluralidade das Existências – grifo nosso).
APELO EMOCIONAL
Quem não sente saudades de seus entes queridos? Quem não tem vontade de
saber como eles estão? Quantos não daria tudo para ouvir sua voz ou conversar
com eles?
Pois bem, o espiritismo, principalmente o kardecismo, afirma que pode
tornar isto possível. Por conta disso, muitos adeptos dessa religião recorrem a
ela em busca de um contato com um parente falecido, especialmente se a morte
foi recente. O ser humano, infelizmente, é propenso a acreditar em qualquer
coisa, desde que aquilo em que acredita sirva para consolá-lo. E é justamente
esse tipo de crença que rende muitos adeptos ao kardecismo. A mesma estratégia
foi usada por um espírito embusteiro contra o rei Saul (ISamuel 28).
A imprensa, em certas ocasiões, tem divulgado que alguns famosos, depois
de mortos, tentaram fazer “contato” com seus familiares, como ocorreu com
Ayrton Senna e tantos outros. Essa publicidade, alimentada pela mídia, serve
para sustentar e garantir o sensacionalismo em massa, e se constitui num
excelente instrumento de divulgação do espiritismo. Se isso não levar as
pessoas a se tornarem praticantes, ao menos faz que o contato com os mortos
pareça algo normal e verdadeiro, sem nenhum questionamento. Parece ser o fim do
mistério da existência pós-morte.
Mas as coisas não são simples assim. Quando o kardecismo toma as
Escrituras para justificar suas práticas e crenças, automaticamente se
autocondena, porque a Bíblia se opõe a este tipo de ensino (contato entre vivos
e mortos). O próprio Jesus, em sua narrativa sobre o rico e Lázaro (Lc.
16.19-31), demonstrou que um morto vir trazer um recado, ou um alerta, para os
vivos estava fora de cogitação. Abraão responde ao rico que temos Moisés e os profetas, ou seja, na Palavra de Deus
encontramos todos os ensinamentos necessários para o homem entender o plano da
Salvação de Deus através de Jesus Cristo. Trocar a revelação de Deus nas
Escrituras, por uma orientação vinda do mundo dos mortos, não faz parte desse
plano de modo algum. Outro ponto a considerar é que o desejo do homem rico era
que seus irmãos soubessem que ele estava em um lugar de tormento, mas, ao
contrário disso, os espíritos que se manifestam no kardecismo sempre alegam
estar em um lugar de luz, beleza e descanso. Os kardecistas se gabam de ter
contato somente com a espiritualidade
superior,trazendo uma mensagem
que é facilmente aceita, por ser aprazível aos ouvidos. Se tais espíritos
advertissem duramente todos aqueles que praticam o pecado e não se arrependem,
com certeza esses supostos contatos seriam rejeitados. Podemos então constatar
que tudo isso não passa de um tremendo engodo.
Além disso, em nenhum lugar da Bíblia é mencionada a existência de um
canal aberto entre o mundo dos mortos e dos vivos. Não existe nenhuma
possibilidade dessa comunicação entre existências tão distintas. Também não é
obra de Deus que almas estejam perambulando por aí sem destino ou com
propósitos duvidosos. “Porque
os vivos sabem que hão de morrer, mas os mortos não sabem coisa nenhuma, nem
tampouco terão eles recompensa, mas a sua memória fica entregue ao
esquecimento. Também o seu amor, o seu ódio, e a sua inveja já pereceram, e já
não têm parte alguma para sempre, em coisa alguma do que se faz debaixo do
sol” (Ec. 9.5-6).
Biblicamente o contato com os mortos sempre foi (e ainda é) algo
proibido por Deus. Embora seja uma prática milenar, de modo algum foi
autorizada pelo Senhor. Muito pelo contrário, trata-se de uma abominação aos
olhos de Deus. O texto de Deuteronômio 18.9-12 (que os espíritas dizem ser uma
tradução adulterada pelos inimigos do espiritismo) mostra que Deus não está
apenas proibindo o contato com os mortos, mas também condenando a adoração a
outros deuses, não porque tais deuses existam, mas porque adorá-los é o mesmo
que adorar os demônios (ICo. 10.20-21). Todo o contexto bíblico sobre o assunto
indica que quem busca comunicar-se com os mortos está se envolvendo com
espíritos enganadores. O próprio Allan Kardec reconheceu e registrou a
impossibilidade de identificação dos espíritos comunicantes no livro O Que É o Espiritismo? no Livro dos Espíritose no Livro dos Médiuns, conforme lemos abaixo:
“A identidade constitui uma das grandes dificuldades do
espiritismo prático. É impossível, com frequência, esclarecê-la… Entre
aqueles que se manifestam, muitos não têm
nome conhecido para nós, e a fim de fixar nossa
atenção, podem assumir o nome de um espirito conhecido que
pertence à mesma categoria. Assim, se um
espíritose comunica com o nome de São Pedro, por exemplo, não há
mais nada que prove que seja exatamente o apóstolo desse nome…” (O Que É o Espiritismo, cap. 2,
Identidade dos Espíritos, item 94 – grifo nosso).
“Um fato que a observação mostrou e foi confirmado pelos próprios
espíritos é que os espíritos inferiores apresentam-se, muitas vezes,
com nomes conhecidos e respeitados… é certo que a substituição dos espíritos
pode ocasionar uma série de enganos e resultar em erros e, muitas vezes, em
mistificações; essa é uma dificuldade do espiritismo prático” (Livro dos
Espíritos, Introdução ao Estudo da Doutrina Espírita, Item 12, A Identidade dos
Espíritos – grifo nosso).
“255. A questão da identidade dos espíritos é uma das mais
controvertidas, mesmo entre os adeptos do espiritismo; é que, com efeito, os
espíritos não nos trazem nenhum documento de identificação e sabe-se
com que facilidade alguns dentre eles assumem nomes de empréstimos… quando
um espírito inferior se apossa do nome respeitável para dar crédito a suas
palavras, e esse caso é tão frequente que não seria demais manter-se em guarda
contra essas espécies de substituições… alguns espíritos sistemáticos, mais
orgulhosos do que sábios, procuram impingir as ideias mais ridículas” (O
Livro dos Médiuns, cap. XXIV, Identidade dos Espíritos, itens 255-256 – grifo nosso).
Sendo assim, a mediunidade, em todas as suas variantes, não passa de um
engano, uma impossibilidade e uma abominação. Bíblia e kardecismo não combinam.
Entendemos os sentimentos das pessoas que se dirigem aos médiuns buscando um
contato com seus saudosos parentes, mas temos o dever de alertar que estão
buscando solução numa prática perniciosa.
APELO ROMÂNTICO
Aproveitando-se do sentimentalismo humano, o kardecismo romantizou sua
doutrina, e fez isso por meio das obras do famoso médium Francisco Cândido
Xavier, que escreveu 412 livros, nos quais os ensinos sistematizados por Kardec
são apresentados em bela prosa poética.
Beleza e verdade não são palavras sinônimas, e mentira e fealdade
(qualidade do feio) não são antônimas. Por exemplo, algo pode ser mentiroso e
belo ao mesmo tempo. O engano pode estar vestido com uma bela roupagem. De
Satanás é dito que era “perfeito
em formosura” (Ez.
28.12). Do Messias foi profetizado que “olhando nós para ele, não havia boa aparência nele, para que o
desejássemos” (Is.
53.2).
A verdade espiritual é algo de extrema seriedade. A beleza não tem poder
para transformar a mentira em verdade. Por outro lado, o que ela pode fazer é
esconder a mentira; ou seja, ocultar os mais terríveis venenos nos pratos mais
saborosos. O apóstolo Paulo nos deu uma clara ideia do que isso
representa: “E não
é maravilha, porque o próprio Satanás se transfigura em anjo de luz. Não é
muito, pois, que os seus ministros se transfigurem em ministros da justiça; o
fim dos quais será conforme as suas obras” (IICo. 11.14-15).
APELO FILANTRÓPICO
Concordamos com Tácito Gama Leite Filho, que afirmou: “A razão do crescimento do kardecismo
no Brasil, após 1950, foi sua ênfase na caridade”. Seu apelo filantrópico é muito
forte. Em um país marcado pela desigualdade social, tudo aquilo que é feito em
prol do próximo é visto com bons olhos. Em termos de marketing, podemos dizer
que a obra social é um dos fatores mais importantes para se criar uma boa
“imagem pública”. Associar esta filantropia com o “amor ao próximo” dos
evangelhos foi a melhor maneira de identificar espiritismo com Cristianismo,
como se este último se resumisse em ajudar os carentes. Até hoje esse apelo
permanece em nosso país como um dos mais fortes.
Além de uma imagem pública positiva, o ato da caridade cria nas pessoas
um agudo senso de justiça própria. A pessoa acaba se julgando melhor que os
outros, ou seja, melhor que aqueles que aos seus olhos não são tão caridosos, e
por conta disso considera-se digna das recompensas divinas. Tal procedimento
faz que essas pessoas “extremamente caridosas” endureçam o coração para receber
o evangelho, porque não conseguem ver a salvação sob o prisma da graça, mas
somente das obras. “Faço muita caridade, logo, sou melhor que os outros”. É
difícil não se ufanar da caridade quando isso constitui a base da salvação.
Assim como as demais religiões, o kardecismo também se vangloria de uma
auto salvação, o que está em desacordo com o evangelho. O apóstolo Paulo
enfatizou que a salvação não depende, de forma alguma, de obras humanas. É uma
graça de Deus e não está relacionada às ações do homem (Rm. 3.21-27; Gl. 2.16;
Ef. 2.8-9; Tt. 3.5). As boas obras são uma consequência da salvação e não o
contrário. A única diferença do kardecismo, em relação às outras religiões, é
que ele contextualizou a auto salvação ao lançar mão do conceito de amor ao
próximo do Cristianismo. É importante frisar o seguinte: identificar o amor
cristão apenas com as obras sociais em favor dos menos favorecidos não é
bíblico. O texto de ICoríntios 13.3 ensina que alguém pode distribuir toda a
sua fortuna aos pobres e, mesmo assim, não ter amor. Embora uma ideia possa de
fato remeter a outra, isso não quer dizer que sejam idênticas.
A obra social é apenas um dos elementos do evangelho e não o seu centro,
como querem os kardecistas. Se cremos realmente que a Bíblia é o padrão de
Deus, entendemos também que o viver cristão inclui muito mais que obras.
Prestar ajuda material é apenas um dos elementos cristãos, não o principal.
Obras sociais não se constituem ponte de salvação nem para quem faz nem para
quem recebe.
Não há como negar que no Brasil as igrejas cristãs perderam o primeiro
lugar na filantropia para os adeptos do espiritismo. Porém, olhando para o
contexto mundial, constata-se que as denominações evangélicas foram apontadas
como as maiores praticantes de obras filantrópicas. Inúmeras organizações
cristãs foram criadas somente para prestar serviços humanitários em todo o
mundo (Save The Children e Médicos Sem Fronteiras são as mais famosas, mas há
muitas outras). A igreja evangélica, seja local ou global, é um grande veículo
de amor ao próximo. Mas por que suas obras não aparecem? Porque as obras não
são a nossa ênfase. Porque não precisamos mostrar o que estamos fazendo. Porque
estamos em obediência ao mandamento de Jesus, que diz que a nossa mão direita
não deve saber o que faz a nossa mão esquerda (Mt. 6.3).
APELO DE CURA
Outro elemento importante para atrair adeptos ao kardecismo é a
realização de “curas espirituais”; ou seja, de supostos milagres. As pessoas
geralmente correm atrás desse tipo de coisa, que para elas é um sinal de
aprovação divina. Em uma dedução simples: “Se é milagroso, então é de Deus”.
Mas isto não é verdade. Deus realmente realiza obras sobrenaturais, mas nem
tudo que é sobrenatural vem de Deus. As Escrituras nos fornecem provas
abundantes a esse respeito.
No livro de Êxodo, por exemplo, temos o confronto de Moisés com os magos
do Egito. Pelo menos três milagres realizados por Moisés, sob o poder de Deus,
foram imitados pelos magos: a vara que se transformou em cobra (Êx. 7.10-12), a
água do rio que virou sangue (Êx. 7.20-22) e a praga das rãs (Êx. 8.6-7).
Em Deuteronômio 13.1-6, temos uma amostra de que a fonte de
manifestações psíquicas pode ser de origem maligna. Uma pessoa pode fazer uma
premonição, seja em forma de profecia ou de sonho, e isso não proceder do
Senhor. A fonte, neste caso, seria maligna, e aquele que faz o “sinal” não foi
inspirado por Deus.
O Novo Testamento é ainda mais explícito quanto à questão de milagres e
maravilhas satânicos. Jesus disse que surgiriam muitos falsos profetas que
fariam tantos sinais e maravilhas, que, se possível fosse, enganariam até os
escolhidos (Mc. 13.22).
O apóstolo Paulo fala da “eficácia de Satanás com todo poder, e sinais, e prodígios de mentira” (IITs 2.9) e o livro de
Apocalipse 16.14, fala sobre “espíritos de demônios, que operam sinais”. Como podemos ver, os poderes
psíquicos não precisam derivar necessariamente do homem, mas de uma fonte
maligna externa. Logo, não existe nada de óbvio em presumir que os milagres
realizados pelos espíritos no kardecismo não sejam divinos. Não há como
compará-los aos milagres bíblicos, uma vez que estes eram realizados
diretamente por Deus, ou por instrumentalidade de um de seus servos, mas nunca
por qualquer espírito. Nem todo poder que age no Universo é benéfico e divino.
Satanás e seus demônios também realizam “milagres”, desde que isso lhes traga
alguma vantagem.
CONCLUSÃO
“De onde viemos?”, “Para onde vamos?”, “Existe vida após a morte
física?”, “O que encontraremos do outro lado?”, “O outro lado existe?”, “É
possível nos comunicarmos com alguém que deseja do outro lado?” É nesse vácuo de dúvidas e incertezas
que o espiritismo prolifera. Espíritas militantes apresentam-se como se
tivessem pleno conhecimento sobre estas questões, como se tivessem redescoberto
o verdadeiro Cristianismo. Mas, quando confrontados pela Bíblia Sagrada, que
condena claramente todas as práticas mediúnicas, os espíritas se esforçam o
quanto podem para tornar desacreditada a Palavra de Deus. Como? Pinçando
dificuldades bíblicas aleatoriamente, sem respeitar nenhuma regra de
hermenêutica e com total desconhecimento histórico.
Não discordamos dos espíritas por negarmos a realidade dos fenômenos
sobrenaturais. O ponto principal da nossa divergência é: os espíritos que se
manifestam nos médiuns são as almas de pessoas mortas ou espíritos caídos, ou
seja, demônios? A Palavra de Deus denuncia como sendo obra de espíritos
enganadores, a serviço da mentira, com o propósito de desviar as pessoas menos
avisadas da verdade.
As Escrituras Sagradas convidam as pessoas a deixarem todas essas
práticas e se voltarem para o Deus verdadeiro. Nenhuma maquiagem pode
transformar algo abominável em algo aceitável, e de forma alguma pode
transformar algo condenado por Deus em veículo de salvação. Sem a aprovação do
prumo das Escrituras, toda obra deve ser rejeitada pelo homem, porque com
certeza será rejeitada por Deus. O Evangelho Segundo o Espiritismo é totalmente reprovado pela Bíblia. O espiritismo segundo o evangelho é uma cilada simpática
promovida pelo inimigo de nossas almas.
Não é tarefa fácil lidar com as convicções desse grupo religioso, porém,
cabe a nós, cristãos, procurarmos meios, com a ajuda do Espírito Santo, de
compartilhar a salvação com os espíritas e suplicar por eles diante de Deus,
para que se arrependam e conheçam a verdade.
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Texto compilado e adaptado por Maria Candida Alves, junho/2018.
Fonte bibliográfica: Revista Defesa da Fé, nº 71, ICP, 2004.
Fontes da internet:
http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u27207.shtml
http://www.revistas.usp.br/ceru/article/view/11863/13640.
[1] Eisegese é o ato de colocar um determinado significado no
texto bíblico, visando objetivos específicos. É o contrário de exegese, que significa extrair um significado da Bíblia. Esse
conceito foi apresentado pelos Pastor Norman L. Geisler no livro Resposta às Seitas.
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