A Bíblia nunca nos manda antecipar a morte de
ninguém. A “boa morte” ou “morte misericordiosa”, como a eutanásia é conhecida, tecnicamente é “a doutrina segundo a qual é lícito
antecipar a morte de pacientes terminais, que estejam sofrendo de enfermidade
incuráveis, aflitivas e dolorosas” (5).
Se no assunto da pena de morte os teólogos estão divididos, na
questão da eutanásia percebemos uma opinião quase comum e que é contrária a tal
prática. Em virtude disso, não necessitaremos nos alongar tanto nesta
questão.
Falando sobre organizações que buscam a legalização da
eutanásia, Hanegraaff diz que na visão destas organizações “‘assassinatos por
misericórdia’ quando se trata de doenças, incapacidades e casos terminais são
um passo para luz”, na ética cristã, porém, “são um passo para a escuridão” (6).
Eutanásia: passiva e ativa
Eutanásia passiva
Quando o doente recusa tratamento médico que está lhe causando
dores e sofrimentos e aceita o curso natural da doença com o risco da morte
(ele não pretende morrer, pretende livrar-se do sofrimento do tratamento que,
não raras vezes, demonstra-se ineficaz).
Quando o paciente continua sendo medicado, mas com restrição aos
usos de tratamentos que provoquem dor, e recebendo cuidados farmacológicos
mínimos que ao menos alivie seu sofrimento, reconhecendo que a doença tem
seu curso natural e que o prolongamento artificial da vida biológica não é
benéfica para o paciente, então diz-se que neste caso ocorre a ortotanásia (“morte correta”), e
não eutanásia.
Eutanásia ativa
Quando o processo de morte é acelerado intencionalmente, seja
por desligamento dos aparelhos hospitalares, seja por injeção de alguma droga,
para por um fim imediato à vida do paciente.
Uma questão a se ponderar é se neste caso, o fato do paciente
permitir que pratiquem contra ele a eutanásia, não estaria ele também
praticando uma forma de suicídio (suicídio assistido), ou se os médicos ou parentes que concordam em acelerar a
morte do paciente não estariam por isso cometendo homicídio. No Código Penal
Brasileiro, em seu Artigo 122, a eutanásia é tipificada como crime já que tal
prática é “induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio
para que o faça”.
Hank Hanegraaf diz que “Embora a eutanásia passiva seja moralmente
admissível, pois permite que o processo de morte siga seu curso natural, a
eutanásia ativa é moralmente proibida, porque envolve, de forma direta, o ato
de tirar a vida humana” (7).
Alan Pallister, num discurso que representa opinião cristã
majoritária, entende que “praticar eutanásia é usurpar o lugar do Deus soberano. Este
dá o espírito que torna o homem uma alma vivente (Gênesis 2:7) e, quando Deus
estende, o espírito volta para ele (Eclesiastes 12:7)”. [8]
O problema do sofrimento
Quase sempre o argumento a que recorrem os defensores da
eutanásia, é o argumento emocional: por que não antecipar a morte de uma pessoa
cuja doença é incurável e que já está em estágio terminal, livrando-a assim de
ficar dias ou até meses sofrendo com a doença sobre uma cama?
Claudionor de Andrade e também Alan Pallister questionam se este
argumento é mesmo sincero, ou se o interesse pela eutanásia é muito mais
financeiro: por um lado, parentes que querem se livrar das despesas e de suas
obrigações para com o doente; por outro lado, operadoras de planos de saúde que
não desejam custear altos gastos com tratamento do doente. Mas, quanto vale uma
vida?
Embora não devamos buscar a dor, nem desejar o sofrimento, fato
é que, como diz Pallister, “faz parte dos propósitos de Deus permitir que a maioria de
seus filhos atravessem períodos de grande sofrimento – os quais contribuem para
seu amadurecimento e santificação (Romanos 5:3 a 5; 2 Coríntios 4:16 e 17;
Tiago 1:2 a 4)” [9]. Como dizia o crítico literário C.S. Lewis, “Deus sussurra em nossos
prazeres, fala em nossa consciência, mas grita em nossas dores; é seu megafone
para despertar um mundo surdo” [10].
O apóstolo Paulo, aquele que trazia as marcas do sofrimento por
amor de Cristo em seu corpo (Gálatas 6:17 2 Coríntioos 11:23 a 38), inspirado
pelo Espírito Santo nos exorta que a nossa “leve e momentânea tribulação produz
para nós um peso eterno de glória mui excelente” (2 Coríntios 4:17). Davi com
muita confiança assim salmodia ao seu Pastor: “Ainda que eu andasse pelo vale
da sombra da morte, não temeria mal algum, porque tu estás comigo; a tua vara e
o teu cajado me consolam” (Salmos 23:4).
Em horas de grande aflição, precisamos nos unir aos coraítas e
assim cantar com fé: “Deus é o nosso refúgio e fortaleza, socorro bem presente
na angústia” (Salmos 46:1).
A Bíblia ensina a consolar-nos uns aos outros (1 Tessalonicenses
4:18), chorar com os que choram (Romanos 12:15), socorrer os que sofrem (1
Timóteo 5:10 a 16; Mateus 25:34 a 36), orar pelos doentes (Tiago 5:14 e 15) e
medicá-los quando preciso (1 Timóteo 5:23). Mas a Bíblia nunca nos manda
antecipar a morte de ninguém, para poupar-lhe da dor e de doenças prolongadas!
O segundo maior mandamento, na perspectiva de Cristo é: “amar ao
próximo como a si mesmo”. E o amor “O amor é sofredor, é benigno… Tudo sofre,
tudo crê, tudo espera, tudo suporta” (1 Coríntios 13:4 a 7). Além do mais, como
Jó que em meio ao sofrimento obtive uma sublime revelação de Deus tal qual
nunca dantes tinha recebido em seus cultos matinais, assim também é
perfeitamente possível que em meio ao sofrimento, Deus esteja querendo se
revelar a nós ou a nossos parentes e amigos de maneira maravilhosa. Como disse
o profeta Naum, “o Senhor tem o seu caminho na tormenta” (Naum 1:3).
Nas palavras do filósofo cristão William Lane Craig, “muito do sofrimento desde
mundo pode parecer totalmente sem sentido em relação ao objetivo de produzir a
felicidade humana, mas não pode ser sem sentido em relação a trazer um
conhecimento mais profundo de Deus” (11). Antes do sofrimento intenso que amargou, e mesmo
quando sua mulher lhe sugeriu amaldiçoar a Deus e morrer, Jó só conhecia a Deus
de ouvir falar; depois do sofrimento, quando Deus se revelara a ele
pessoalmente em meio ao redemoinho (Jó 38:1), Jó então pode dizer: “agora meus
olhos te veem…” (Jó 42:5).
Creio que mesmo sofrendo dores terríveis, precisamos confiar em
Deus, como uma mulher grávida confia que dará a luz ao filho querido, ainda que
em meio a terríveis dores de parto.
Por Thiago Rosas
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