Conteúdo do Artigo
Visão geral do uso da palavra “mandamentos” no Novo Testamento
No Novo Testamento, a palavra “mandamentos” (em grego, “entolai”) desempenha um papel central na compreensão da ética cristã e da relação entre os seguidores de Jesus e a lei divina. No entanto, é crucial entender que o uso deste
termo no contexto do Novo Testamento é muito mais nuançado e multifacetado do que uma simples referência aos Dez Mandamentos do Sinai.A palavra grega “entolai” aparece
aproximadamente 67 vezes no Novo Testamento, distribuída entre os Evangelhos,
Atos dos Apóstolos, as epístolas paulinas e as epístolas gerais. Cada
ocorrência merece uma análise cuidadosa, considerando o contexto imediato, o
autor, o público-alvo e o propósito geral do texto.
Nos Evangelhos, encontramos Jesus
frequentemente discutindo os mandamentos. No entanto, é notável que Ele não se
limita a uma mera reiteração dos Dez Mandamentos. Em vez disso, Jesus
frequentemente expande, reinterpreta e às vezes até parece contradizer a
compreensão tradicional dos mandamentos. Um exemplo claro disso é o Sermão da
Montanha (Mateus 5-7), onde Jesus repetidamente usa a frase “Ouvistes que foi
dito… Eu, porém, vos digo”, indicando uma nova interpretação ou aplicação dos
mandamentos antigos. Por exemplo:
“Ouvistes que foi
dito aos antigos: Não matarás; e quem matar estará sujeito a julgamento. Eu,
porém, vos digo que todo aquele que [sem motivo] se irar contra seu irmão
estará sujeito a julgamento.” (Mateus 5:21-22)
Nas epístolas paulinas, o
conceito de “mandamentos” ganha uma nova dimensão. Paulo, escrevendo
principalmente para comunidades gentias, frequentemente discute a relação entre
a lei mosaica e a nova aliança em Cristo. Ele argumenta que os crentes não
estão mais “sob a lei”, mas isso não significa que estejam sem lei. Em vez
disso, eles estão sob a “lei de Cristo”:
“Aos que vivem fora
da lei, tornei-me como se vivesse fora da lei (embora não esteja livre da lei
de Deus, e sim sob a lei de Cristo), a fim de ganhar os que vivem fora da lei.”
(1 Coríntios 9:21)
“Levai as cargas uns
dos outros e, assim, cumprireis a lei de Cristo.” (Gálatas 6:2)
Nas epístolas joaninas,
especialmente em 1 João, o conceito de “mandamentos” é fortemente ligado ao
amor. João repetidamente enfatiza que o mandamento principal é amar uns aos outros,
ecoando o “novo mandamento” de Jesus:
“Um novo mandamento
vos dou: Que vos ameis uns aos outros; como eu vos amei a vós, que também vós
uns aos outros vos ameis.” (João 13:34)
É importante notar que, em muitos
casos, quando o Novo Testamento fala de “mandamentos”, não está se referindo a
uma lista específica de regras, mas a uma orientação ética geral baseada no
amor a Deus e ao próximo. Isso é evidenciado pela resposta de Jesus quando
questionado sobre o maior mandamento:
“Mestre, qual é o
grande mandamento na lei? Respondeu-lhe Jesus: Amarás o Senhor, teu Deus, de
todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu entendimento. Este é o
grande e primeiro mandamento. O segundo, semelhante a este, é: Amarás o teu
próximo como a ti mesmo. Destes dois mandamentos dependem toda a lei e os
profetas.” (Mateus 22:36-40)
Além disso, o uso da palavra
“mandamentos” no Novo Testamento frequentemente está ligado à ideia de
“permanecer em Cristo” ou “permanecer no amor de Deus”. Isso sugere que os
mandamentos não são vistos primariamente como regras externas a serem seguidas,
mas como expressões de uma relação íntima com Deus:
“Se guardardes os
meus mandamentos, permanecereis no meu amor; assim como também eu tenho
guardado os mandamentos de meu Pai e no seu amor permaneço.” (João 15:10)
É crucial também considerar o
contexto histórico e teológico da igreja primitiva ao interpretar o uso de
“mandamentos” no Novo Testamento. A comunidade cristã estava passando por uma
transição significativa, movendo-se de uma fé enraizada no judaísmo para uma
que abraçava gentios. Isso levantou questões importantes sobre quais aspectos
da lei mosaica ainda se aplicavam aos seguidores de Cristo, especialmente aos
gentios.
O Concílio de Jerusalém, descrito
em Atos 15, abordou diretamente esta questão, decidindo não impor a lei mosaica
aos gentios convertidos, com exceção de algumas restrições específicas:
“Pareceu bem ao
Espírito Santo e a nós não vos impor maior encargo além destas coisas
essenciais: que vos abstenhais das coisas sacrificadas a ídolos, bem como do
sangue e da carne de animais sufocados e das relações sexuais ilícitas; destas
coisas fareis bem se vos guardardes. Saúde!” (Atos 15:28-29)
Outro aspecto importante a
considerar é como o conceito de “mandamentos” no Novo Testamento se relaciona
com a ideia de graça. Os autores do Novo Testamento, especialmente
Paulo, enfatizam repetidamente que a salvação vem pela graça através
da fé, e não pela observância da lei:
“Porque pela graça
sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus; não de obras,
para que ninguém se glorie.” (Efésios 2:8-9)
No entanto, eles também insistem
que a fé deve produzir boas obras:
“Meus irmãos, que
adianta alguém dizer que tem fé se não tem obras? Acaso a fé pode salvá-lo?”
(Tiago 2:14)
É também relevante notar que
Jesus, em várias ocasiões, fala de “meus mandamentos”:
“Se me amais,
guardareis os meus mandamentos.” (João 14:15)
Isso sugere que Ele se via como
uma nova autoridade, dando novos mandamentos que, embora muitas vezes alinhados
com a lei mosaica, não eram simplesmente uma reiteração dela.
A ideia de Jesus como um novo
legislador, dando novos mandamentos, é particularmente significativa quando se
considera a crença cristã em Jesus como o cumprimento da lei:
“Não penseis que vim
revogar a Lei ou os Profetas; não vim para revogar, vim para cumprir.” (Mateus
5:17)
Nesta perspectiva, os mandamentos de Jesus não substituem
os Dez Mandamentos, mas os cumprem e os elevam a um novo nível de compreensão e
aplicação.
Em conclusão, uma visão geral do
uso da palavra “mandamentos” no Novo Testamento revela uma rica tapeçaria de
significados e aplicações. Longe de ser uma simples referência aos Dez
Mandamentos, o termo é usado para abranger uma ampla gama de instruções éticas
e espirituais, fundamentadas no amor a Deus e ao próximo, e intimamente ligadas
à nova aliança estabelecida por Jesus Cristo. Esta compreensão mais ampla e
nuançada dos “mandamentos” no Novo Testamento é crucial para uma interpretação
adequada das Escrituras e para a aplicação dos ensinamentos de Jesus na vida
cristã contemporânea.
10
Razões Porque a Interpretação Adventista dos Mandamentos é Incorreta
1. Ignora o Contexto Histórico:
A interpretação adventista falha em considerar o contexto histórico da
transição do judaísmo para o cristianismo. Jesus e os apóstolos estavam
estabelecendo uma nova aliança que transcendia a lei mosaica.
“Porque a lei foi
dada por intermédio de Moisés; a graça e a verdade vieram por meio de Jesus
Cristo.” (João 1:17)
2. Negligencia o Novo Mandamento de Jesus:
Ao focar exclusivamente nos Dez Mandamentos, os adventistas ignoram o “novo
mandamento” explicitamente dado por Jesus:
“Um novo mandamento
vos dou: Que vos ameis uns aos outros; como eu vos amei a vós, que também vós
uns aos outros vos ameis.” (João 13:34)
3. Contradiz o Ensino de Paulo sobre a Lei:
Paulo argumenta claramente que os crentes não estão mais sob a lei, o que inclui
os Dez Mandamentos:
“Porque o pecado não
terá domínio sobre vós; pois não estais debaixo da lei, e sim da graça.”
(Romanos 6:14)
4. Desconsidera a Nova Aliança:
A interpretação adventista falha em reconhecer a natureza da nova aliança, que
é baseada na lei escrita nos corações, não em tábuas de pedra:
“Esta é a aliança
que farei com eles, depois daqueles dias, diz o Senhor: Porei no seu coração as
minhas leis e sobre a sua mente as inscreverei,” (Hebreus 10:16)
5. Limita a Autoridade de Jesus:
Ao insistir que Jesus sempre se referia aos Dez Mandamentos, os adventistas
limitam a autoridade de Jesus como novo legislador:
“Porque ele as
ensinava como quem tem autoridade e não como os escribas.” (Marcos 1:22)
6. Ignora a Expansão Ética de Jesus:
Jesus frequentemente expandiu e aprofundou o significado dos mandamentos, indo
além de sua interpretação literal:
“Ouvistes que foi
dito aos antigos: Não matarás; e quem matar estará sujeito a julgamento. Eu,
porém, vos digo que todo aquele que [sem motivo] se irar contra seu irmão
estará sujeito a julgamento.” (Mateus 5:21-22)
7. Contradiz a Decisão do Concílio de Jerusalém:
O Concílio de Jerusalém, ao decidir sobre as obrigações dos gentios, não
menciona a observância dos Dez Mandamentos:
“Pareceu bem ao
Espírito Santo e a nós não vos impor maior encargo além destas coisas
essenciais: que vos abstenhais das coisas sacrificadas a ídolos, bem como do
sangue e da carne de animais sufocados e das relações sexuais ilícitas;” (Atos
15:28-29)
8. Desconsidera a Ênfase no Espírito:
Paulo enfatiza a vida no Espírito sobre a observância da lei:
“Se, porém, sois
guiados pelo Espírito, não estais sob a lei.” (Gálatas 5:18)
9. Falha em Reconhecer a Obsolescência da Antiga Aliança:
O autor de Hebreus argumenta claramente que a antiga aliança (que incluía os
Dez Mandamentos) tornou-se obsoleta:
“Quando ele diz
Nova, torna antiquada a primeira. Ora, aquilo que se torna antiquado e
envelhecido está prestes a desaparecer.” (Hebreus 8:13)
10. Promove um Legalismo Contrário ao Evangelho:
A insistência na observância dos Dez Mandamentos como o cerne da vida cristã
promove um legalismo que Paulo combateu veementemente:
“Sabendo, contudo,
que o homem não é justificado por obras da lei, e sim mediante a fé em Cristo
Jesus, também nós cremos em Cristo Jesus, para que fôssemos justificados pela
fé em Cristo e não por obras da lei, pois, por obras da lei, ninguém será
justificado.” (Gálatas 2:16)
A interpretação adventista dos
mandamentos, ao insistir que Jesus e os apóstolos sempre se referiam exclusivamente
aos Dez Mandamentos, revela-se profundamente falha à luz de uma análise bíblica
abrangente. Esta interpretação não apenas ignora o contexto histórico e
teológico do Novo Testamento, mas também falha em reconhecer a natureza
transformadora e expansiva dos ensinamentos de Jesus e dos apóstolos.
Os mandamentos no Novo Testamento
são muito mais do que um código legal fixo; eles são um chamado à transformação
radical do coração, guiada pelo Espírito Santo e fundamentada no amor de
Cristo. A insistência em limitar os “mandamentos” aos Dez Mandamentos do Sinai
diminui a riqueza e a profundidade da nova aliança estabelecida por Jesus.
Portanto, é crucial que os
crentes busquem uma compreensão mais ampla e nuançada dos mandamentos de Jesus,
reconhecendo que eles englobam toda a vida de fé, amor e obediência a que somos
chamados em Cristo. Somente assim podemos verdadeiramente abraçar a liberdade e
a vida abundante que o evangelho oferece.
Exemplos
chave do uso da palavra “mandamentos” no Novo Testamento
No Novo Testamento, encontramos
diversos exemplos cruciais do uso da palavra “mandamentos” que nos ajudam a
compreender como Jesus e os apóstolos interpretavam e aplicavam este conceito.
Vamos examinar alguns desses exemplos-chave em detalhes:
a) Mateus 22:36-40 – Jesus resume os mandamentos em dois
Este é possivelmente o exemplo
mais significativo e frequentemente citado quando se trata da interpretação de
Jesus sobre os mandamentos. Quando questionado por um especialista na lei sobre
qual era o maior mandamento, Jesus respondeu:
“Mestre, qual é o
grande mandamento na lei? Respondeu-lhe Jesus: Amarás o Senhor, teu Deus, de
todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu entendimento. Este é o
grande e primeiro mandamento. O segundo, semelhante a este, é: Amarás o teu
próximo como a ti mesmo. Destes dois mandamentos dependem toda a lei e os
profetas.”
Nesta passagem, Jesus faz algo
notável. Em vez de simplesmente citar um dos Dez Mandamentos, Ele sintetiza
toda a lei em dois princípios fundamentais: amar a Deus e amar ao próximo. Isso
demonstra que, para Jesus, o conceito de “mandamentos” vai além de uma lista de
regras para incluir princípios abrangentes que devem guiar todas as ações e
decisões.
É importante notar que Jesus não
está negando a validade dos Dez Mandamentos ou do resto da lei mosaica. Em vez
disso, Ele está fornecendo uma lente através da qual toda a lei deve ser
interpretada e aplicada. Este exemplo sugere que, para Jesus, a essência dos
mandamentos é o amor, não a obediência cega a regras.
b) João 13:34 – Jesus dá um “novo mandamento” de amor
mútuo
Durante a Última Ceia, Jesus
introduz o conceito de um “novo mandamento”:
“Um novo mandamento
vos dou: Que vos ameis uns aos outros; como eu vos amei a vós, que também vós
uns aos outros vos ameis.”
Este é um momento crucial na
narrativa do Evangelho. Jesus está prestes a ser traído e crucificado, e Ele
escolhe este momento para dar aos seus discípulos um “novo mandamento”. Isso
levanta várias questões importantes:
1. Em que sentido este mandamento
é “novo”? O amor ao próximo já era parte da lei mosaica, como vimos no exemplo
anterior.
2. Como este “novo mandamento” se
relaciona com os mandamentos anteriores?
3. Qual é a implicação de Jesus
dar um “novo mandamento”?
O que torna este mandamento “novo”
é o padrão de amor que Jesus estabelece: “como eu vos amei”. Jesus está
elevando o padrão de amor de simplesmente amar o próximo como a si mesmo para
amar como Ele amou – um amor sacrificial que culminaria em sua morte na cruz.
Este exemplo demonstra que Jesus
se via como tendo autoridade para dar novos mandamentos, não apenas para
interpretar os antigos. Isso tem implicações significativas para nossa
compreensão de Jesus como um novo legislador.
c) 1 João 3:23 – O mandamento é crer em Jesus e amar uns
aos outros
Na primeira epístola de João,
encontramos outra interpretação crucial dos mandamentos:
“E o seu mandamento
é este: que creiamos no nome de seu Filho Jesus Cristo e nos amemos uns aos
outros, segundo o mandamento que nos deu.”
Aqui, João sintetiza os
mandamentos em duas partes: fé em Jesus Cristo e amor mútuo. Isso é
significativo por várias razões:
1. A fé em Jesus é apresentada
como um mandamento, algo que não encontramos explicitamente nos Dez Mandamentos
ou na lei mosaica.
2. O amor mútuo é reiterado,
ecoando o “novo mandamento” de Jesus.
3. João usa o singular
“mandamento”, sugerindo que estas duas partes – fé e amor – são inseparáveis e
formam um único mandamento.
Este exemplo demonstra como a
compreensão dos mandamentos evoluiu na igreja primitiva. Para João, os
mandamentos não são mais primariamente sobre observância ritual ou regras
comportamentais, mas sobre uma relação com Jesus Cristo que se manifesta em
amor pelos outros.
d) Outros exemplos importantes:
1. Marcos 10:17-19 – Jesus cita
alguns dos Dez Mandamentos ao responder ao jovem rico:
“E, pondo-se Jesus a
caminho, correu um homem ao seu encontro e, ajoelhando-se, perguntou-lhe: Bom
Mestre, que farei para herdar a vida eterna? Respondeu-lhe Jesus: Por que me
chamas bom? Ninguém é bom senão um, que é Deus. Tu sabes os mandamentos: Não
matarás, não adulterarás, não furtarás, não dirás falso testemunho, não
defraudarás ninguém, honra a teu pai e tua mãe.”
2. João 14:15 – Jesus liga o amor
por Ele à obediência aos Seus mandamentos:
“Se me amais,
guardareis os meus mandamentos.”
3. 1 João 5:3 – João define o
amor a Deus em termos de obediência aos Seus mandamentos:
“Porque este é o
amor de Deus: que guardemos os seus mandamentos; ora, os seus mandamentos não
são penosos.”
4. Apocalipse 14:12 – Os
mandamentos de Deus são ligados à fé em Jesus:
“Aqui está a
perseverança dos santos, os que guardam os mandamentos de Deus e a fé em
Jesus.”
Estes exemplos-chave nos fornecem
uma visão abrangente de como o conceito de “mandamentos” é usado e interpretado
no Novo Testamento. Eles demonstram que, embora os Dez Mandamentos e a lei
mosaica ainda sejam respeitados, há uma nova ênfase no amor, na fé em Jesus e
na aplicação dos princípios divinos de uma maneira que vai além da mera observância
de regras.
Esta nova compreensão dos
mandamentos é fundamental para a teologia do Novo Testamento e para a vida
cristã. Ela enfatiza uma relação pessoal com Deus através de Jesus Cristo,
manifestada em amor prático pelos outros, em vez de uma religião baseada
primariamente em regras e rituais.
Análise
detalhada das ocorrências de “mandamentos” no Novo Testamento
Para uma compreensão abrangente
do uso do termo “mandamentos” no Novo Testamento, é essencial examinar suas
ocorrências nos diferentes livros e contextos. Vamos analisar essas ocorrências
por categoria:
1. Nos Evangelhos:
a) Mateus:
Mateus usa o termo “mandamentos” (entolai) 6 vezes. Um exemplo significativo é:
“Portanto, quem
violar um destes mandamentos, ainda que dos menores, e assim ensinar aos
homens, será chamado menor no reino dos céus; aquele, porém, que os observar e
ensinar, esse será chamado grande no reino dos céus.” (Mateus 5:19)
Aqui, Jesus enfatiza a
importância de observar os mandamentos, mas no contexto do Sermão da Montanha,
onde Ele também reinterpreta vários aspectos da lei.
b) Marcos:
Marcos usa o termo 2 vezes, notavelmente na história do jovem rico:
“Tu sabes os
mandamentos: Não matarás, não adulterarás, não furtarás, não dirás falso
testemunho, não defraudarás ninguém, honra a teu pai e tua mãe.” (Marcos 10:19)
c) Lucas:
Lucas usa o termo 4 vezes, incluindo uma passagem similar à de Marcos:
“Sabes os
mandamentos: Não adulterarás, não matarás, não furtarás, não dirás falso
testemunho, honra a teu pai e a tua mãe.” (Lucas 18:20)
d) João:
João usa o termo 10 vezes em seu evangelho, frequentemente relacionando-o ao
amor e à obediência a Jesus:
“Se guardardes os
meus mandamentos, permanecereis no meu amor; assim como também eu tenho
guardado os mandamentos de meu Pai e no seu amor permaneço.” (João 15:10)
2. Nos Atos dos Apóstolos:
O termo aparece apenas uma vez em
Atos, no contexto do Concílio de Jerusalém:
“Porquanto ouvimos
que alguns que saíram dentre nós, sem nenhuma autorização, vos têm perturbado
com palavras, transtornando a vossa alma, dizendo: É necessário circuncidar-vos
e guardar a lei, aos quais não demos ordem.” (Atos 15:24)
Aqui, o termo é usado em relação
à lei mosaica e à questão de sua aplicabilidade aos gentios convertidos.
3. Nas Epístolas Paulinas:
Paulo usa o termo “mandamentos”
de maneira variada em suas cartas:
a) Romanos: “Pois os mandamentos: Não adulterarás, não matarás, não
furtarás, não cobiçarás, e qualquer outro mandamento, todos se resumem neste
preceito: Amarás o teu próximo como a ti mesmo.” (Romanos 13:9)
Paulo aqui ecoa o resumo de Jesus
dos mandamentos, enfatizando o amor ao próximo.
b) 1 Coríntios: “A circuncisão nada
é, e a incircuncisão nada é, mas, sim, a observância dos mandamentos de Deus.”
(1 Coríntios 7:19)
Neste contexto, Paulo está
discutindo a relatividade de práticas religiosas externas em comparação com a
obediência a Deus.
c) Efésios: “para que dos dois criasse, em si mesmo, um novo homem,
fazendo a paz, e reconciliasse ambos em um só corpo com Deus, por intermédio da
cruz, destruindo por ela a inimizade. E, vindo, evangelizou paz a vós outros
que estáveis longe e paz também aos que estavam perto; porque, por ele, ambos
temos acesso ao Pai em um Espírito.” (Efésios 2:15-18)
Embora não use explicitamente o
termo “mandamentos”, esta passagem é relevante para nossa discussão, pois fala
sobre a abolição da “lei dos mandamentos na forma de ordenanças”.
4. Nas Epístolas Gerais:
a) 1 João:
João usa o termo “mandamentos”
extensivamente em sua primeira epístola, frequentemente ligando-o ao amor:
“Aquele
que diz: Eu o conheço e não guarda os seus mandamentos é mentiroso, e nele não
está a verdade.” (1 João 2:4)
“E
este é o seu mandamento: que creiamos no nome de seu Filho Jesus Cristo e nos
amemos uns aos outros, segundo o seu mandamento.” (1 João 3:23)
b) 2 João:
“E
agora, senhora, peço-te, não como se escrevesse mandamento novo, senão o que
tivemos desde o princípio: que nos amemos uns aos outros.” (2 João 1:5)
5. No Apocalipse:
O livro do Apocalipse usa o termo
“mandamentos” várias vezes, geralmente em referência aos fiéis que os guardam:
“Aqui
está a perseverança dos santos, os que guardam os mandamentos de Deus e a fé em
Jesus.” (Apocalipse 14:12)
Análise geral:
- 1. Diversidade de uso: O
termo “mandamentos” é usado de maneiras diferentes ao longo do Novo
Testamento. Às vezes refere-se claramente aos Dez Mandamentos ou à lei
mosaica, outras vezes aos ensinamentos de Jesus, e em alguns casos a um
princípio geral de obediência a Deus.
- 2. Reinterpretação: Há
uma clara tendência, especialmente nos ensinamentos de Jesus e nas
epístolas, de reinterpretar os mandamentos em termos de amor a Deus e ao
próximo.
- 3. Nova Aliança: Muitas
ocorrências, particularmente nas epístolas, colocam os mandamentos no
contexto da nova aliança em Cristo, frequentemente contrastando-os com a
antiga lei.
- 4. Relação com a fé: Especialmente
em João e no Apocalipse, há uma estreita ligação entre guardar os
mandamentos e ter fé em Jesus.
- 5. Ética prática: Os
mandamentos são frequentemente apresentados não como regras abstratas, mas
como princípios para viver em comunidade e expressar amor.
Esta análise detalhada revela que
o conceito de “mandamentos” no Novo Testamento é multifacetado e dinâmico.
Longe de ser uma simples referência a um conjunto fixo de regras, o termo é
usado para expressar uma variedade de ideias relacionadas à obediência a Deus,
ao amor ao próximo e à vida na nova aliança estabelecida por Jesus Cristo.
Contexto
histórico do uso de “mandamentos” no Novo Testamento
Para compreender plenamente o uso
e a interpretação dos “mandamentos” no Novo Testamento, é crucial examinar o
contexto histórico em que esses textos foram escritos. Este contexto abrange o
período do ministério de Jesus até o final do primeiro século, quando os
últimos livros do Novo Testamento foram compostos.
1. O contexto judaico do primeiro século:
No tempo de Jesus, o judaísmo era
uma religião centrada na lei. A Torah (os primeiros cinco livros do Antigo
Testamento) era considerada a palavra direta de Deus, e os Dez Mandamentos
ocupavam um lugar de destaque nesta lei. Além disso, os rabinos haviam
desenvolvido uma extensa tradição oral interpretando e aplicando a lei a várias
situações da vida.
O historiador Flávio Josefo,
escrevendo no final do primeiro século, descreve várias seitas judaicas e suas
abordagens à lei. Por exemplo, ele nota que os fariseus eram conhecidos por sua
estrita adesão não apenas à lei escrita, mas também às tradições orais:
“Os fariseus
transmitiram ao povo certas regulações transmitidas por gerações anteriores e
não encontradas nas Leis de Moisés.” (Antiguidades Judaicas, 13.10.6)
2. A missão aos gentios e o conflito sobre a lei:
Com a expansão do cristianismo
para além do mundo judaico, surgiu um conflito significativo sobre a
aplicabilidade da lei mosaica aos convertidos gentios. Este conflito é evidente
em várias passagens do Novo Testamento, como a controvérsia sobre a circuncisão
em Atos 15:
“Então, alguns da
seita dos fariseus que haviam crido se levantaram, dizendo: É necessário
circuncidá-los e determinar-lhes que observem a lei de Moisés.” (Atos 15:5)
O Concílio de Jerusalém, descrito
em Atos 15, foi uma tentativa de resolver este conflito. A decisão do concílio
de não impor a lei mosaica aos gentios, exceto por algumas restrições
específicas, foi um momento crucial na história da igreja primitiva:
“Pareceu bem ao
Espírito Santo e a nós não vos impor maior encargo além destas coisas
essenciais: que vos abstenhais das coisas sacrificadas a ídolos, bem como do
sangue e da carne de animais sufocados e das relações sexuais ilícitas; destas
coisas fareis bem se vos guardardes. Saúde!” (Atos 15:28-29)
3. A influência do pensamento helenístico:
À medida que o cristianismo se
expandia no mundo greco-romano, ele entrava em contato com ideias filosóficas
helenísticas. Isso pode ter influenciado a maneira como alguns autores do Novo
Testamento, particularmente Paulo, interpretavam e aplicavam o conceito de
“mandamentos”.
Por exemplo, a ideia estoica de
uma lei moral universal pode ter influenciado a forma como Paulo fala sobre a
“lei escrita nos corações” em Romanos 2:
“Estes mostram que o
que a lei requer está escrito em seus corações, sendo disso testemunha também a
sua consciência e os seus pensamentos, alternadamente acusando-os ou
defendendo-os.” (Romanos 2:15)
4. A destruição do Templo em 70 d.C.:
Um evento histórico crucial que
ocorreu durante o período de composição do Novo Testamento foi a destruição do
Templo de Jerusalém pelos romanos em 70 d.C. Este evento teve um impacto
profundo no judaísmo e, por extensão, na igreja cristã primitiva.
A destruição do Templo eliminou o
centro do sistema sacrificial judaico, levando a uma reinterpretação de muitos
aspectos da lei mosaica. Isso pode ter influenciado a forma como os autores
posteriores do Novo Testamento, como o autor de Hebreus, interpretavam os
“mandamentos” em relação ao novo pacto em Cristo:
“Porque, se aquele
primeiro pacto tivesse sido sem defeito, jamais se teria buscado lugar para um
segundo.” (Hebreus 8:7)
5. A separação crescente entre o cristianismo e o
judaísmo:
Ao longo do primeiro século,
houve uma separação gradual entre o cristianismo e o judaísmo. Isso é refletido
na forma como os “mandamentos” são discutidos nos escritos posteriores do Novo
Testamento.
Por exemplo, no Evangelho de
João, escrito provavelmente no final do primeiro século, vemos uma distinção
clara entre “seus mandamentos” (referindo-se aos mandamentos de Jesus) e a lei
mosaica:
“Se guardardes os
meus mandamentos, permanecereis no meu amor; assim como também eu tenho
guardado os mandamentos de meu Pai e no seu amor permaneço.” (João 15:10)
6. A expectativa do retorno iminente de Cristo:
A crença na volta iminente de
Cristo, prevalente na igreja primitiva, também influenciou a compreensão dos
“mandamentos”. Isso é particularmente evidente no livro do Apocalipse, onde a obediência
aos mandamentos de Deus é vista como uma característica crucial dos fiéis que
aguardam o retorno de Cristo:
“Aqui está a
perseverança dos santos, os que guardam os mandamentos de Deus e a fé em
Jesus.” (Apocalipse 14:12)
O contexto histórico do primeiro
século fornece uma rica tapeçaria contra a qual podemos entender o uso e a
interpretação dos “mandamentos” no Novo Testamento. A transição de uma
comunidade predominantemente judaica para uma fé que abraçava os gentios, o
conflito sobre a aplicabilidade da lei mosaica, a influência do pensamento
helenístico, eventos históricos como a destruição do Templo, e a separação
gradual entre o cristianismo e o judaísmo – todos esses fatores contribuíram
para moldar a compreensão dos “mandamentos” na igreja primitiva.
Este contexto histórico nos ajuda
a entender por que o conceito de “mandamentos” no Novo Testamento é tão
multifacetado, abrangendo desde referências diretas aos Dez Mandamentos até
interpretações mais amplas baseadas no amor e na fé em Jesus Cristo. Ele também
ilumina a tensão contínua entre a continuidade com a tradição judaica e a
novidade radical do evangelho de Cristo, uma tensão que é central para muitas
das discussões sobre os “mandamentos” no Novo Testamento.
A Teologia Paulina dos Mandamentos
Paulo
de Tarso, também conhecido como o Apóstolo Paulo, desempenhou um papel crucial
no desenvolvimento da teologia cristã primitiva, particularmente em relação à
compreensão da lei e dos mandamentos. Sua perspectiva única como fariseu
convertido e apóstolo aos gentios oferece insights valiosos sobre como os
primeiros cristãos interpretavam e aplicavam os mandamentos no contexto da nova
aliança em Cristo.
- A Lei e a Justificação pela Fé
Um
dos temas centrais da teologia paulina é a justificação pela fé, em oposição à
justificação pelas obras da lei. Paulo argumenta veementemente que a salvação
vem através da fé em Cristo, não pela observância da lei:
“Sabendo, contudo,
que o homem não é justificado por obras da lei, e sim mediante a fé em Cristo
Jesus, também nós cremos em Cristo Jesus, para que fôssemos justificados pela
fé em Cristo e não por obras da lei, pois, por obras da lei, ninguém será
justificado.” (Gálatas 2:16)
Esta
ênfase na fé sobre as obras da lei não significa, no entanto, que Paulo rejeite
completamente o conceito de mandamentos ou obediência.
- A Lei de Cristo
Paulo
introduz o conceito da “lei de Cristo”, que parece ser uma reinterpretação dos
mandamentos à luz do evangelho:
“Levai as cargas uns
dos outros e, assim, cumprireis a lei de Cristo.” (Gálatas 6:2)
Esta
“lei de Cristo” é frequentemente entendida como focada no amor e no serviço
mútuo, ecoando o “novo mandamento” de Jesus.
- O Propósito da Lei
Paulo
vê a lei mosaica como tendo um propósito pedagógico, preparando o caminho para
Cristo:
“De maneira que a
lei nos serviu de aio para nos conduzir a Cristo, a fim de que fôssemos
justificados por fé.” (Gálatas
3:24)
Ele
argumenta que, com a vinda de Cristo, os crentes não estão mais “sob a lei”,
mas isso não significa que estejam sem lei ou sem obrigações morais.
- A Lei Escrita nos Corações
Em
Romanos, Paulo fala sobre uma lei moral universal, escrita nos corações de
todos os seres humanos:
“Estes mostram que o
que a lei requer está escrito em seus corações, sendo disso testemunha também a
sua consciência e os seus pensamentos, alternadamente acusando-os ou
defendendo-os.” (Romanos 2:15)
Esta
ideia sugere que, para Paulo, os mandamentos não são meramente regras externas,
mas princípios morais intrínsecos à natureza humana.
- O Cumprimento da Lei no Amor
Paulo
frequentemente resume os mandamentos em termos de amor:
“Não devais coisa
alguma a ninguém, exceto o amor com que vos ameis uns aos outros; pois quem ama
o próximo tem cumprido a lei. Pois isto: Não adulterarás, não matarás, não
furtarás, não cobiçarás, e, se há qualquer outro mandamento, tudo nesta palavra
se resume: Amarás o teu próximo como a ti mesmo.” (Romanos 13:8-9)
Esta
ênfase no amor como cumprimento da lei ecoa o ensinamento de Jesus sobre os
dois grandes mandamentos.
- A Tensão entre Liberdade e Obediência
Paulo
luta com a tensão entre a liberdade cristã e a necessidade de obediência moral:
“Porque vós, irmãos,
fostes chamados à liberdade; porém não useis da liberdade para dar ocasião à
carne; sede, antes, servos uns dos outros, pelo amor.” (Gálatas 5:13)
Ele
insiste que a liberdade do cristão da lei mosaica não é uma licença para o
pecado, mas uma oportunidade para servir por amor.
- Os Mandamentos e a Vida no Espírito
Paulo
frequentemente contrasta a vida sob a lei com a vida no Espírito:
“Mas, se sois
guiados pelo Espírito, não estais sob a lei.” (Gálatas 5:18)
Para
Paulo, a obediência aos mandamentos de Deus não é uma questão de seguir regras
externas, mas de viver em harmonia com o Espírito Santo.
- A Continuidade e Descontinuidade com a Lei
Mosaica
Paulo
reconhece tanto a continuidade quanto a descontinuidade entre a lei mosaica e a
nova aliança em Cristo:
“Anulamos, pois, a
lei pela fé? Não, de maneira nenhuma! Antes, confirmamos a lei.” (Romanos 3:31)
Ele
vê os mandamentos morais da lei como ainda válidos, mas reinterpretados e
cumpridos em Cristo.
A
teologia paulina dos mandamentos é complexa e multifacetada. Paulo rejeita a
ideia de que a observância da lei mosaica seja necessária para a salvação, mas
mantém um forte senso de obrigação moral para os crentes. Ele reinterpreta os
mandamentos à luz do evangelho, enfatizando o amor, a liberdade em Cristo e a
vida no Espírito.
Para
Paulo, os mandamentos não são um conjunto de regras externas a serem seguidas
mecanicamente, mas princípios morais que fluem naturalmente de uma vida
transformada pela fé em Cristo e habitada pelo Espírito Santo. Esta perspectiva
teve uma influência profunda na compreensão cristã dos mandamentos, fornecendo
uma base teológica para a ética cristã que vai além da mera observância da lei,
enfatizando a transformação interior e o amor como a essência da obediência a
Deus.
Jesus como Novo
Legislador
A
ideia de Jesus como um novo legislador é fundamental para a compreensão cristã
dos mandamentos no Novo Testamento. Esta perspectiva apresenta Jesus não apenas
como um intérprete da lei mosaica, mas como alguém que traz uma nova autoridade
legislativa, redefinindo e expandindo o conceito de “mandamentos” no contexto
da nova aliança.
- Jesus e a Lei Mosaica
Jesus
frequentemente se referia à lei mosaica em seus ensinamentos, mas com uma
autoridade que ia além da interpretação tradicional:
“Ouvistes que foi
dito aos antigos: Não matarás; e quem matar estará sujeito a julgamento. Eu,
porém, vos digo que todo aquele que [sem motivo] se irar contra seu irmão
estará sujeito a julgamento.” (Mateus
5:21-22)
Nesta
e em outras passagens do Sermão da Montanha, Jesus usa a frase “Ouvistes que
foi dito… Eu, porém, vos digo”, indicando uma nova autoridade legislativa.
- O Cumprimento da Lei
Jesus
afirmou que veio para cumprir a lei, não para aboli-la:
“Não penseis que vim
revogar a Lei ou os Profetas; não vim para revogar, vim para cumprir.” (Mateus 5:17)
Este
“cumprimento” não significa simplesmente obedecer à lei, mas elevar seu
significado e aplicação a um novo nível.
- O Novo Mandamento
Jesus
introduziu explicitamente um “novo mandamento”:
“Um novo mandamento
vos dou: Que vos ameis uns aos outros; como eu vos amei a vós, que também vós
uns aos outros vos ameis.” (João
13:34)
Este
novo mandamento não contradiz os antigos, mas os eleva e os resume de uma nova
maneira, com Jesus como o padrão de amor.
- A Autoridade de Jesus
Jesus
frequentemente falava com uma autoridade que surpreendia seus ouvintes:
“Porque ele as
ensinava como quem tem autoridade e não como os escribas.” (Marcos 1:22)
Esta
autoridade se estendia à sua interpretação e aplicação da lei.
- Os Mandamentos de Jesus
Jesus
frequentemente se referia aos “seus” mandamentos:
“Se me amais,
guardareis os meus mandamentos.” (João
14:15)
Isso
sugere que Jesus via seus ensinamentos como tendo força de lei para seus
seguidores.
- A Reinterpretação dos Mandamentos
Jesus
frequentemente reinterpretava os mandamentos existentes, enfatizando sua
intenção espiritual sobre a observância literal:
“O sábado foi feito
por causa do homem, e não o homem por causa do sábado.” (Marcos 2:27)
- Os Dois Grandes Mandamentos
Quando
questionado sobre o maior mandamento, Jesus resumiu toda a lei em dois
princípios:
“Respondeu-lhe
Jesus: Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e
de todo o teu entendimento. Este é o grande e primeiro mandamento. O segundo,
semelhante a este, é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Destes dois
mandamentos dependem toda a lei e os profetas.” (Mateus 22:37-40)
Esta
síntese demonstra a autoridade de Jesus para interpretar e priorizar os
mandamentos.
- A Nova Aliança
Jesus
estabeleceu uma nova aliança, que implica um novo conjunto de expectativas e
mandamentos:
“Este cálice é a
nova aliança no meu sangue, derramado em favor de vós.” (Lucas 22:20)
- O Julgamento Final
Nos
ensinamentos de Jesus sobre o julgamento final, ele coloca seus próprios
mandamentos como o padrão pelo qual as pessoas serão julgadas:
“Então, dirá o Rei
aos que estiverem à sua direita: Vinde, benditos de meu Pai! Entrai na posse do
reino que vos está preparado desde a fundação do mundo. Porque tive fome, e me
destes de comer; tive sede, e me destes de beber; era forasteiro, e me hospedastes;” (Mateus 25:34-35)
- A Comissão dos Apóstolos
Jesus
comissionou seus apóstolos para ensinar tudo o que ele havia comandado:
“Ensinando-os a
guardar todas as coisas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco todos
os dias até à consumação do século.” (Mateus
28:20)
Isso
indica que os mandamentos de Jesus deveriam ser a base do ensino cristão.
A
perspectiva de Jesus como um novo legislador é central para a compreensão
cristã dos mandamentos no Novo Testamento. Jesus não apenas interpretou a lei
existente, mas trouxe uma nova autoridade, reinterpretando, priorizando e até
mesmo expandindo os mandamentos no contexto da nova aliança que ele
estabeleceu.
Esta
visão de Jesus como legislador tem implicações profundas para a ética cristã.
Ela sugere que os seguidores de Jesus devem olhar não apenas para os Dez
Mandamentos ou a lei mosaica, mas para os ensinamentos e o exemplo de Jesus
como sua principal fonte de orientação moral. Ao mesmo tempo, Jesus não rejeita
a lei antiga, mas a cumpre e a eleva, enfatizando o amor a Deus e ao próximo
como o cerne de todos os mandamentos.
A
autoridade legislativa de Jesus também fundamenta a compreensão cristã da graça
e da fé. Seus mandamentos não são vistos como um novo conjunto de regras a
serem seguidas mecanicamente, mas como expressões de uma nova relação com Deus,
baseada no amor e na transformação interior pelo Espírito Santo.
Esta
perspectiva de Jesus como novo legislador, portanto, oferece uma base teológica
para uma ética cristã que é ao mesmo tempo enraizada na tradição bíblica e
radicalmente nova, centrada no amor e na graça de Deus revelados em Jesus
Cristo.
Implicações dos
Mandamentos de Jesus para os Gentios
A expansão do cristianismo além
do mundo judaico levantou questões cruciais sobre a aplicabilidade dos
mandamentos e da lei mosaica aos crentes gentios. Os ensinamentos de Jesus e
sua interpretação pelos apóstolos tiveram implicações profundas para como os
gentios deveriam entender e aplicar os mandamentos em suas vidas.
1. Universalidade dos Ensinamentos de Jesus
Os mandamentos de Jesus, em
contraste com a lei mosaica, não eram ligados a uma identidade étnica
específica:
“Ide, portanto,
fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e
do Espírito Santo; ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho
ordenado. E eis que estou convosco todos os dias até à consumação do século.”
(Mateus 28:19-20)
Esta comissão implica que os
ensinamentos de Jesus eram destinados a todas as pessoas, independentemente de
sua origem étnica.
2. O Concílio de Jerusalém
O debate sobre a aplicabilidade
da lei mosaica aos gentios culminou no Concílio de Jerusalém, descrito em Atos
15:
“Pareceu bem ao
Espírito Santo e a nós não vos impor maior encargo além destas coisas
essenciais: que vos abstenhais das coisas sacrificadas a ídolos, bem como do
sangue e da carne de animais sufocados e das relações sexuais ilícitas; destas
coisas fareis bem se vos guardardes. Saúde!” (Atos 15:28-29)
Esta decisão libertou os gentios
da necessidade de observar a totalidade da lei mosaica, focando em algumas
proibições específicas e na ética moral geral.
3. A Lei do Amor
O “novo mandamento” de Jesus e
sua ênfase no amor como cumprimento da lei tinham implicações particulares para
os gentios:
“Toda a lei se
cumpre em um só preceito, a saber: Amarás o teu próximo como a ti mesmo.”
(Gálatas 5:14)
Esta ênfase no amor permitiu que
os gentios abraçassem a essência dos mandamentos sem necessariamente adotar as
práticas culturais judaicas.
4. Liberdade da Lei Cerimonial
Paulo argumentou fortemente que
os gentios não estavam obrigados a seguir as leis cerimoniais judaicas:
“Estais desligados de Cristo, vós que procurais
justificar-vos na lei; da graça decaístes.” (Gálatas 5:4)
Isso significava que práticas
como a circuncisão e as leis dietéticas não eram obrigatórias para os gentios.
5. A Lei Moral Universal
Paulo argumentou que existe uma
lei moral universal, escrita nos corações de todas as pessoas:
“Quando, pois, os
gentios, que não têm lei, procedem, por natureza, de conformidade com a lei,
não tendo lei, servem eles de lei para si mesmos.” (Romanos 2:14)
Isso sugere que os gentios já
tinham uma base para entender e seguir os princípios morais dos mandamentos de
Jesus.
6. A Nova Identidade em Cristo
Paulo enfatizou que, em Cristo,
as distinções étnicas perdiam sua importância primária:
“Dessarte, não pode
haver judeu nem grego; nem escravo nem liberto; nem homem nem mulher; porque
todos vós sois um em Cristo Jesus.” (Gálatas 3:28)
Isso implicava que os mandamentos
e a ética cristã deveriam ser aplicados igualmente a todos os crentes,
independentemente de sua origem.
7. A Liberdade Cristã
Paulo ensinou sobre a liberdade
cristã, particularmente relevante para os gentios:
“Para a liberdade
foi que Cristo nos libertou. Permanecei, pois, firmes e não vos submetais, de
novo, a jugo de escravidão.” (Gálatas 5:1)
Esta liberdade, no entanto, não
era uma licença para o pecado, mas uma oportunidade de viver pelo Espírito.
8. A Ênfase na Transformação Interior
Os ensinamentos de Jesus
enfatizavam a transformação do coração sobre a observância exterior:
“Ai de vós, escribas
e fariseus, hipócritas, porque limpais o exterior do copo e do prato, mas
estes, por dentro, estão cheios de rapina e intemperança!” (Mateus 23:25)
Esta ênfase era particularmente
relevante para os gentios, que não tinham uma tradição de observância da lei
mosaica.
9. A Contextualização Cultural
Paulo demonstrou uma abordagem
contextual na aplicação dos mandamentos:
“Fiz-me como judeu
para os judeus, a fim de ganhar os judeus; para os que vivem sob o regime da
lei, como se eu mesmo assim vivesse, a fim de ganhar os que vivem debaixo da
lei, embora não esteja eu debaixo da lei.” (1 Coríntios 9:20)
Isso sugere uma flexibilidade na
aplicação dos mandamentos em diferentes contextos culturais.
10. A Ênfase nos Frutos do Espírito
Paulo enfatizou os frutos do
Espírito como evidência de uma vida piedosa:
“Mas o fruto do
Espírito é: amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade,
fidelidade, mansidão, domínio próprio. Contra estas coisas não há lei.”
(Gálatas 5:22-23)
Esta ênfase forneceu um framework
ético para os gentios que não dependia do conhecimento detalhado da lei
mosaica.
As implicações dos mandamentos de
Jesus para os gentios foram revolucionárias. Eles ofereceram um caminho para a
piedade e a obediência a Deus que não exigia a adoção da identidade cultural
judaica. Os gentios foram chamados a abraçar o cerne ético dos mandamentos – o
amor a Deus e ao próximo – sem necessariamente aderir às práticas cerimoniais e
culturais específicas do judaísmo.
Esta abordagem permitiu que o cristianismo
se tornasse uma fé verdadeiramente universal, capaz de se adaptar a diversos
contextos culturais sem perder sua essência ética. Ao mesmo tempo, manteve uma
continuidade com a tradição bíblica, reinterpretando e aplicando os princípios
morais dos mandamentos de uma maneira que era relevante e acessível para
pessoas de todas as origens.
A ênfase na transformação
interior, na liberdade em Cristo e nos frutos do Espírito forneceu um framework
ético que ia além da mera observância de regras externas. Isso permitiu que os
gentios vivessem vidas piedosas e obedientes a Deus, guiadas pelo Espírito
Santo e fundamentadas no amor, sem a necessidade de se conformar às
especificidades da lei mosaica.
Em última análise, as implicações
dos mandamentos de Jesus para os gentios demonstram a natureza inclusiva e
transformadora do evangelho, oferecendo um caminho de obediência a Deus que é
ao mesmo tempo exigente e libertador, universal em seu alcance e profundamente
pessoal em sua aplicação.
Contrapontos à Interpretação
Adventista
A interpretação adventista do
sétimo dia, que insiste que as referências de Jesus e dos apóstolos aos
“mandamentos” se referem exclusivamente aos Dez Mandamentos do Sinai, é
fundamentalmente falha e ignora o contexto mais amplo e a natureza transformadora
dos ensinamentos de Jesus. Vamos examinar os contrapontos a esta interpretação:
1. A Reinterpretação Radical de Jesus
Jesus não apenas reiterou os Dez
Mandamentos, mas os reinterpretou e expandiu radicalmente:
“Ouvistes que foi
dito: Olho por olho, dente por dente. Eu, porém, vos digo: não resistais ao
perverso; mas, a qualquer que te ferir na face direita, volta-lhe também a
outra;” (Mateus 5:38-39)
Esta abordagem demonstra que
Jesus estava estabelecendo uma nova compreensão ética que ia além dos limites
dos Dez Mandamentos.
2. O Novo Mandamento
Jesus explicitamente deu um “novo
mandamento”:
“Um novo mandamento
vos dou: Que vos ameis uns aos outros; como eu vos amei a vós, que também vós
uns aos outros vos ameis.” (João 13:34)
Este mandamento não faz parte dos
Dez Mandamentos e demonstra que Jesus estava expandindo e redefinindo o
conceito de “mandamentos”.
3. A Síntese dos Mandamentos
Quando questionado sobre o maior
mandamento, Jesus não citou nenhum dos Dez Mandamentos, mas sintetizou toda a
lei em dois princípios:
“Amarás o Senhor,
teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu
entendimento. Este é o grande e primeiro mandamento. O segundo, semelhante a
este, é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Destes dois mandamentos dependem
toda a lei e os profetas.” (Mateus 22:37-40)
4. A Lei do Espírito
Paulo fala de uma “lei do
Espírito” que substitui a “lei do pecado e da morte”:
“Porque a lei do
Espírito da vida, em Cristo Jesus, te livrou da lei do pecado e da morte.”
(Romanos 8:2)
Isto indica uma nova realidade
ética que vai além dos Dez Mandamentos.
5. A Liberdade da Lei
Paulo argumenta veementemente que
os crentes não estão mais sob a lei:
“Porque o pecado não
terá domínio sobre vós; pois não estais debaixo da lei, e sim da graça.”
(Romanos 6:14)
Isto contradiz diretamente a
ideia de que os cristãos estão obrigados a seguir os Dez Mandamentos como um
código legal.
6. A Nova Criação
Paulo enfatiza que em Cristo, a
velha ordem (incluindo a lei) passou:
“E, assim, se alguém
está em Cristo, é nova criatura; as coisas antigas já passaram; eis que se
fizeram novas.” (2 Coríntios 5:17)
7. O Cumprimento da Lei em Cristo
Jesus afirmou que veio cumprir a
lei:
“Não penseis que vim
revogar a Lei ou os Profetas; não vim para revogar, vim para cumprir.” (Mateus
5:17)
Este cumprimento sugere uma nova
realidade ética em Cristo, não uma simples continuação da antiga lei.
8. A Lei Escrita nos Corações
A nova aliança prometida por
Jeremias e citada em Hebreus fala de uma lei escrita nos corações, não em
tábuas de pedra:
“Esta é a aliança
que farei com eles, depois daqueles dias, diz o Senhor: Porei no seu coração as
minhas leis e sobre a sua mente as inscreverei,” (Hebreus 10:16)
9. A Obsolescência da Antiga Aliança
O autor de Hebreus argumenta que
a antiga aliança (que incluía os Dez Mandamentos) tornou-se obsoleta:
“Quando ele diz
Nova, torna antiquada a primeira. Ora, aquilo que se torna antiquado e
envelhecido está prestes a desaparecer.” (Hebreus 8:13)
10. A Ênfase nos Frutos do Espírito
Paulo enfatiza os frutos do
Espírito como a evidência de uma vida piedosa, não a observância dos Dez
Mandamentos:
“Mas o fruto do
Espírito é: amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade,
fidelidade, mansidão, domínio próprio. Contra estas coisas não há lei.”
(Gálatas 5:22-23)
Conclusão
Os mandamentos de Jesus
transcendem vastamente os limites estreitos dos Dez Mandamentos do Sinai. Eles
não são um mero código legal gravado em pedra, mas uma lei viva, escrita nos
corações dos crentes pelo Espírito Santo. Os mandamentos de Jesus são um chamado
à transformação radical do ser, não apenas do comportamento externo.
Jesus nos chama a uma obediência
que brota do amor, não do medo. Ele nos convida a uma ética do Reino que vai
além da mera conformidade a regras, para uma vida de amor sacrificial, perdão
radical e graça abundante. Os mandamentos de Jesus não são um fardo pesado, mas
um jugo leve que nos liberta para viver na plenitude do amor de Deus.
Em Cristo, somos chamados não a
uma obediência servil a um código antigo, mas a uma nova vida no Espírito. Os
mandamentos de Jesus são um convite à liberdade – liberdade do pecado,
liberdade do legalismo, liberdade para amar como Ele amou.
Portanto, fixemos nossos olhos
não nas tábuas de pedra do Sinai, mas no Cristo vivo, cuja vida, morte e
ressurreição nos libertaram para uma nova forma de obediência. Que possamos
abraçar plenamente os mandamentos de Jesus, não como uma lista de regras a
serem seguidas, mas como um caminho de amor a ser vivido, um caminho que nos
leva à verdadeira liberdade e à vida abundante que Cristo prometeu.
Que o mundo conheça que somos
discípulos de Jesus não pela nossa adesão a um código legal antigo, mas pelo
amor que demonstramos uns pelos outros e por todos os que nos rodeiam. Pois é
neste amor – o amor que Jesus comandou e exemplificou – que toda a lei é
cumprida e o Reino de Deus é manifestado na terra.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Graça e Paz de Cristo, será um prazer receber seu comentário. Jesus te abençoe.