O contexto é a libertação do povo hebreu
da escravidão no país das pirâmides, liderada por Moisés, o filho de uma
hebreia que foi criado no palácio de faraó como filho da filha de faraó.
Cônscio de sua origem, Moisés, após matar um egípcio ao defender o seu povo,
foge para a terra de Midiã, e passa a viver como um pastor de ovelhas. Contudo,
ele era o escolhido por Deus para
livrar o seu povo da escravidão no Egito. Deus aparece à Moisés na sarça
ardente e o comissiona a voltar ao Egito e libertar o seu povo (Êxodo 3). No
primeiro momento, Moisés resiste, mas acaba cedendo e retorna ao Egito com essa
árdua missão (Êxodo 4).
A primeira páscoa foi
instituída no Egito, para marcar o princípio dos meses – como o início do ano
religioso, como marco da redenção do povo hebreu e da sua liberdade (Êxodo 12:2). A ordem
divina escolhe o mês de Nisã, início da primavera no hemisfério norte, para ser
o primeiro mês do ano israelita.
A celebração da Páscoa
A celebração da Páscoa seria uma festa
familiar, o cardápio principal seria um cordeiro de um ano sem defeito para
cada família. O cordeiro seria separado no dia 10 de Nisã e guardado por quatro
dias. Do décimo ao décimo quarto dia o cordeiro ficaria em observação para que
não apresentasse nenhum defeito, a fim de estar apto para o sacrifício. No dia
da Páscoa 14 de Nisã o cordeiro seria sacrificado à tarde (Êxodo 12:3-6). Segundo Flávio Josefo, esse sacrifício era oferecido entre
as 15 e 17 horas.
Acrescenta-se
ao cardápio principal a matzá – pães ázimos (pão sem fermento), e o marór –
ervas amargosas. A matzá – refere-se ao pão da aflição, da privação de ser
escravo, e que também se tornou o símbolo da liberdade. Enquanto o marór –
refere-se a amargura de ser escravo.
Os
dois juntos para o judeu, tem um significado de dualismo da vida, se por um
lado há liberdade, não se deve esquecer jamais a amargura da escravidão, e, nos
tempos de opressão, a chama da esperança de liberdade deve-se manter acesa.
Ou como encontramos no comentário dos
editores da Torá – a Lei de Moisés: “A união desses dois elementos ensina que
apenas quem experimentou o doce sabor da liberdade é capaz de compreender a
amargura da opressão, e vice-versa. É a convivência milenar com esse dualismo
que fez o povo judeu suportar tantas e tão nefastas provocações no decorrer de
sua história, até alcançar, o restabelecimento de seu próprio estado nacional
em nossos dias, que, baseado nos ensinamentos da Torá, representa o prenúncio
da concretização das profecias messiânicas e da redenção global da humanidade”
(Torá, 2001, p. 185).
Além disso, há a restrição de não comer
“nada cru, nem cozido em água, senão assado no fogo”, e isso não é tudo,
deveria se comer o cordeiro com “a sua cabeça com os seus pés e com a sua
fressura”, o cordeiro inteiro simboliza a unidade completa de toda a família de
Israel; sem sobras, e o que sobrar seria queimado pela manhã (Êxodo 12:8-10).
E o jeito de se comer a Páscoa na saída
do Egito é ordenado aos filhos de Israel: “Assim pois o comereis: Os vossos
lombos cingidos, os vossos sapatos nos pés, e o vosso cajado na mão; e o
comereis apressadamente; esta é a páscoa do Senhor” (Êxodo 12:11), lombos cingidos, sapatos nos pés e cajado na mão, por quê?
Porque acontecerá a libertação da escravidão, a saída do Egito – o Êxodo; “esta
é a páscoa do Senhor, páscoa (heb. Pessach) significa: passagem; passar por
cima, quando o Senhor passaria pelo Egito para derramar a décima e última
praga, a morte dos primogênitos (Êx.12:12,13).
O sangue do cordeiro
Deus ordenou que o
sangue derramado do cordeiro, fosse passado nas portas das casas dos hebreus:
“E tomarão do sangue, e pô-lo-ão em ambas as ombreiras, e na verga da porta,
nas casas em que o comerem” (Êxodo 12:7).
A fé do povo foi manifestada em função da obediência ao
mandamento divino. O sangue passado na verga e nos umbrais, foi o sinal que
Deus usou para poupar a vida dos filhos primogênitos no momento que o anjo da
morte passou, ferindo a terra do Egito: “E aquele sangue vos será por sinal nas
casas em que estiverdes; vendo eu sangue, passarei por cima de vós, e não
haverá entre vós praga de mortandade, quando eu ferir a terra do Egito” (Êxodo 12:13).
Os israelitas usaram o hissopo para passar o sangue na verga
e nas ombreiras das portas, e ficaram dentro de suas casas protegidos pelo
sangue do cordeiro, conforme lemos em Êxodo 12:22-23: “o SENHOR passará
para ferir os egípcios, porém quando vir o sangue na veja da porta, e em ambas
as ombreiras, o SENHOR passará aquela porta e não deixará o destruidor entrar
em vossas casas, para vos ferir”.
Considere isso, cada família israelita sacrificar um cordeiro
no Egito poderia se visto como uma grande afronta às crenças dos egípcios, pois
“O carneiro era um animal sagrado entre os egípcios. Aqueles dentre os
israelitas que não tivessem coragem de afrontar os egípcios, matando um
carneiro e aspergindo o sangue nas portas, no lado externo de suas casas, não
gozariam de isenção da morte do primogênito. Assim, desde os tempos bíblicos, o
israelita-hebreu-judeu é educado a ter a sinceridade e a coragem de proclamar
publicamente sua crença e fé no Deus único” (Torá, 2001, p. 186), felizmente
esse ato de fé e coragem terminou bem para os israelitas.
As
10 pragas sobre os deuses do Egito
Os juízos de Deus
enviados ao Egito foi uma clara demonstração de superioridade sobre os falsos
deuses do Egito em contraste ao único, vivo, verdadeiro e todo poderoso Deus de
Israel, conforme lemos em Êxodo 12:12: “E eu
passarei pela terra do Egito esta noite, e ferirei todo o primogênito na terra
do Egito, desde os homens até aos animais; e em todos os deuses do Egito farei
juízos. Eu sou o Senhor”, as pragas feriram mortalmente as divindades egípcias
de acordo com Carlos Osvaldo:
·
A praga
das águas transformadas em sangue revelou a autoridade de Yahweh sobre o Nilo,
o rio sustentava a vida do Egito (7:14-24).
·
A praga
de rãs revelou a superioridade de Yahweh sobre a deusa Heqt e produziu o
primeiro ciclo de permissão-negação por parte de Faraó (8:1-14).
·
A praga
dos piolhos revelou a superioridade de Yahweh sobre o deus Set, o deus do
deserto [poeira?] e levou os magos a admitir a intervenção divina (8:16-19).
·
A praga
das moscas revelou a superioridade de Yahweh sobre o deus Uatchit, estabeleceu
a distinção entre Israel – a nação a ser libertada – e o Egito –, a nação a ser
julgada, e fez Faraó repetir sua falsa promessa de permissão (8:32).
·
A praga
da peste nos rebanhos egípcios demonstrou a superioridade de Yahweh sobre Ápis,
o deus-touro, e Hathor, a deusa-vaca, ao preservar o gado dos israelitas
(9:1-7).
- A
praga das úlceras nas pessoas e no gado demonstrou a superioridade de
Yahweh sobre Ísis, a deusa da cura, sobre Sekhmet, deusa dos remédios, e
sobre Sunu (deus da peste), incapacitando os magos que se opunham a Moisés
e Arão (9:8-12).
- A
praga da saraiva revelou a superioridade de Yahweh sobre Nut [deus do
céu], Osíris [deus das colheitas e da fertilidade] e Set [deus das
tempestades], inspirando temor de Deus em alguns oficiais egípcios, em
contraste com a renovada dureza de Faraó (9:13-35).
- A
praga dos gafanhotos revelou a superioridade de Yahweh sobre Nut e Osíris
e evidenciou o profundo descontentamento na corte do Egito com a política
obstinada de Faraó, que o levou a violar sua promessa mais uma vez
(10:1-20).
- A
praga das trevas revelou a superioridade de Yahweh sobre Rá e Hórus,
divindades do sol, e sobre Nut, deus do céu, produzindo uma confrontação
final entre Moisés e Faraó (10:21-29).
- A
anunciada praga da morte dos primogênitos revelaria a superioridade, de
Yahweh, sobre Min, deus da reprodução, sobre Ísis, a deusa da cura, e
sobre o herdeiro de Faraó, considerado divino pelos egípcios, quebrando
por fim a obstinada resistência do monarca quanto à libertação de Israel
(11:1-10) (PINTO, 2006, p. 75-76).
Jetro, o sogro de
Moisés reconheceu: “(…) O Senhor é maior que todos os deuses (…)” (Êxodo
18:10-11).
A Páscoa como memorial eterno
A celebração da páscoa
passou a ter um caráter eterno: “E este dia vos será por memória, e
celebrá-lo-eis por festa ao Senhor; nas vossas gerações o celebrareis por
estatuto perpétuo” (Êxodo 12:14), podemos entender a
razão do memorial nas palavras do Rabino Lord Jonathan Sacks: “o antigo Egito e
a antiga Israel eram dois povos que fizeram a mais decisiva das perguntas:
como, num curto período de tempo, é possível criar algo que perdure para
sempre? Como é possível conquistar a imortalidade? Os egípcios deram uma
resposta: construir grandes monumentos de pedra – templos, pirâmides – que resistirão
aos ventos e areias do tempo. E assim fizeram. O que eles construíram continua
em pé. Mas apenas os edifícios, e não a civilização que um dia lhes deu vida.
Os israelitas deram uma resposta diferente. Vocês não precisam criar
monumentos. Tudo o que precisam fazer é contar a história de geração após
geração. Vocês precisam gravar seus valores
nos corações dos seus filhos e eles nos dos filhos deles, de modo que vocês
vivam dentro deles, e assim por diante, até o fim dos tempos”, a história
provou que os israelitas estavam certos. Este ano vamos ouvir novamente: “Hag
Pessach Sameach – Feliz festa de Páscoa”.
A
Páscoa do Egito e o Messias
Agora,
aqui está o próximo passo – entender como a festa da Páscoa e seus agentes se
aplica ao Messias de Israel e a sua obra salvadora.
Em primeiro lugar o
Senhor Jesus é apresentado por João o Batista como: “o Cordeiro de Deus, que
tira o pecado do mundo” (João
1:29b), ele é o cordeiro prometido que derramaria o seu precioso
sangue para salvar a humanidade caída, aqui está o porquê: “e sem derramamento
de sangue não há remissão” (Hb.9:22b),
essa é uma referência explicita a Levítico que fala da expiação do pecado pelo
derramamento de sangue no altar.
O
cordeiro era escolhido, separado para ficar em observação e, se apresentasse as
condições necessárias, era sacrificado e tinha o seu sangue passado sobre a
verga e os umbrais das portas dos israelitas. Tendo isso em vista, vejamos a
comparação com a vida e a obra do Senhor Jesus:
– O Senhor Jesus após
três anos e meio de ministério público havia sido examinado pelo povo de
Israel: “Quem dentre vós me convence de pecado? E se vos digo a verdade, por
que não me credes?” (João
8:46), e foi achado sem culpa, perfeito;
– Depois de ser preso foi interrogado pelo Sumo Sacerdote e
pelo Sinédrio: “Ora, os principais sacerdotes, e os anciãos, e todo o conselho,
buscavam falso testemunho contra Jesus, para poderem dar-lhe a morte; 60. E não
o achavam; apesar de se apresentarem muitas testemunhas falsas, não o achavam.
Mas, por fim chegaram duas testemunhas falsas” (Mt.26:59-60), tirando as duas
falsas testemunhas foi achado novamente sem culpa, apto como um cordeiro
imaculado;
Também foi examinado pelas autoridades políticas de
Israel Pilatos o presidente romano da Judéia e o rei Herodes: “E, convocando
Pilatos os principais sacerdotes, e os magistrados, e o povo, 14. Disse-lhes:
Haveis-me apresentado este homem como pervertedor do povo; e eis que,
examinando-o na vossa presença, nenhuma culpa, das de que o acusais, acho neste
homem. 15. Nem mesmo Herodes, porque a ele vos remeti, e eis que não tem feito
coisa alguma digna de morte” (Lucas 23:13-15), nem a cúpula
política de Israel encontrou culpa em Jesus.
Depois de um exame
minucioso como do cordeiro pascal, o Senhor Jesus é escolhido profeticamente
pelo sumo sacerdote Caifás para morrer em lugar do povo: “Nem considerais que
nos convém que um homem morra pelo povo, e que não pereça toda a nação” (João 11:50).
O pão da Páscoa – Matzá
Como se não bastasse temos a figura da matzá o símbolo de
aflição, especialmente quando quebrada, mas também de pureza por estar isenta
de fermento – símbolo de pecado na Bíblia (1Co.5:8). Para nos salvar, Deus
teve que se tornar homem, fazer parte da raça (1 Tm.2:5) mas sem pecado, e sofrer
em carne! Ele se tornou homem (matzá quebrada), porém nunca deixou de ser Deus
(matzá devolvida ao Ehad). Como homem ele sofreu por nós (Isaías 53:1-12; Mateus 26:26-29).
Jesus entregou seu
espírito na hora nona (16h.), conforme Lucas
23:44-46: “E era já quase a hora sexta, e houve trevas em toda a
terra até à hora nona, escurecendo-se o sol; 45. E rasgou-se ao meio o véu do
templo. 46. E, clamando Jesus com grande voz, disse: Pai, nas tuas mãos entrego
o meu espírito. E, havendo dito isto, expirou.” (conf. Mt.27:46; Mc.15:33-37),
confirmando o registro do historiador judeu Flávio Josefo.
Diante
de todos esses fatos bíblicos o apóstolo Paulo pode afirmar: “Porque Cristo,
nossa páscoa, foi sacrificado por nós” (1 Coríntios 5:7b), assim como a morte
do cordeiro pascal marcou a liberdade da escravidão do povo de Israel, a morte
do Messias naquela semana de páscoa marcou a liberdade da escravidão do pecado
do homem.